A economia em 2024: "vai prevalecer o caminho cauteloso, no estilo da diretoria do Banco Central"
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- Gabriel Brito, da Redação
- 08/03/2024
Carlos Eduardo Carvalho/ Reproduçao Youtube Canal 2P Candeia
Com o aparecimento de pesquisas que supõem um recuo na popularidade do governo, alguns analistas e críticos dos dogmas neoliberais tentam instá-lo a ser mais ousado na política econômica. Os 3% de crescimento econômico em 2023, em contexto de aumento das despesas federais com políticas sociais, são o eixo desta argumentação. No entanto, para além das razões econômicas a dura realidade é que seguimos sob cerco ideológico conservador também na economia. Dessa forma, as margens para avançar neste ano serão estreitas, como explica o economista Carlos Eduardo Carvalho.
Professor da PUC, onde leciona na faculdade de Ralações Internacionais, o mestre e doutor em economia não tem dúvidas sobre os limites da atual política econômica, no sentido de criar bem estar social, mas não vê saídas diante do atual esquema de governabilidade que ata o governo Lula. “É inescapável (aumentar despesas para crescer com integração social), o problema é como fazer isso sem gerar grande confusão na economia, com percepção de risco mais elevada, inflação maior. Parece claro que não existe fórmula mágica e voluntariosa”.
Dentro de tal contexto, Carvalho afirma que a saída seria uma forte revisão de gastos públicos que considera parasitários. O corte de despesas excessivas - a exemplo dos privilégios do alto funcionalismo público, emendas parlamentares que alimentam o fisiologismo sem estruturar políticas consequentes, benesses ao setor militar - poderia aliviar as contas públicas e liberar dinheiro para as necessidades reais do país. Mas novamente bate-se no muro das forças políticas e seus interesses em jogo.
De outro lado, a orientação rentista/financista segue a sufocar o Estado e suas tarefas constitucionais. Fora dos muros institucionais, pode-se inferir que a renitente timidez dos setores que elegeram Lula em apresentar com mais ênfase uma agenda econômica popular, enquanto a expectativa pelo encaminhamento dos processos dos golpistas parece deixar tudo suspenso no ar, deixa o governo ainda mais conformado a estratégias conservadoras de gestão da economia.
“O governo precisaria ter outro arco de alianças e outro enfoque político para bater de frente com o sistema financeiro e conseguir acordos viáveis que não desequilibrem a economia. O governo não tem meios para fazer isso, inclusive por não ter disposição nem capacidade de pensar em uma estratégia deste tipo”.
Confira a entrevista com Carlos Eduardo Carvalho.
Correio da Cidadania: Como analisou o Orçamento Geral da União para 2024? O que ele revela do Novo Arcabouço Fiscal em sua concretude?
Carlos Eduardo Carvalho: Pode ser considerado o orçamento possível dentro das restrições políticas em que se move o governo: dificuldades para corrigir favorecimentos e eliminar privilégios, pelos interesses no Congresso e na base que o dá apoio ao governo; dificuldades para avançar na reforma dos gastos pelas resistências da base que sustenta originalmente o PT.
Houve avanços importantes, com as propostas de avançar na tributação direta, no imposto de renda sobre os mais ricos, e desonerar os mais pobres; nas medidas para fechar alguns ralos de mau uso do dinheiro público. São avanços consideráveis, apesar de pequenos.
Correio da Cidadania: Houve aumento real na capacidade de investimento do governo, de acordo com o crescimento observado pelo país em 2023?
Carlos Eduardo Carvalho: O aumento é pequeno, mas relevante.
Correio dim, compromete. A alternativa melhor seria reduzir despesas inúteis e parasitárias, algo politicamente muito difícil, como expus no início.
Correio da Cidadania: E o chamado déficit de 2023? Como você o interpreta?
Carlos Eduardo Carvalho: Houve uma dose importante de antecipação de despesas, o que aumentou o déficit, de forma a gerar resultado melhor em 2024.
Correio da Cidadania: Para crescimento com integração social, após anos de estagnação e até recessão, não seria inescapável o aumento de gastos públicos?
Carlos Eduardo Carvalho: Sim, é inescapável, o problema é como fazer isso sem gerar grande confusão na economia, com percepção de risco mais elevada, inflação maior. Parece claro que não existe fórmula mágica e voluntariosa.
Correio da Cidadania: É possível obter déficit zero e crescimento ao mesmo tempo?
Carlos Eduardo Carvalho: É difícil, a menos que uma ampla revisão das despesas aumente a eficiência e deixe claro que o governo terá liberdade para investir. E aí voltamos às restrições políticas.
Correio da Cidadania: Como analisa a questão da dúvida pública, dos juros e do peso do sistema financeiro em nossa orientação econômica?
Carlos Eduardo Carvalho: O governo precisaria ter outro arco de alianças e outro enfoque político para bater de frente com o sistema financeiro e conseguir acordos viáveis que não desequilibrem a economia. O governo não tem meios para fazer isso, inclusive por não ter disposição nem capacidade de pensar em uma estratégia deste tipo.
Correio da Cidadania: Acredita que o governo possa, ou deva, avançar no debate aqui posto?
Carlos Eduardo Carvalho: Não acredito que avançará, diante do que já expus. Vai prevalecer o caminho cauteloso, no estilo da diretoria do Banco Central, como já tem ocorrido.
Gabriel Brito é jornalista, repórter do Outra Saúde e editor do Correio da Cidadania.
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