Emissões de CO2: é possível contê-las em curto prazo ?
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- Joaquim Francisco de Carvalho
- 10/12/2008
Em novembro passado, Sir Nicholas Stern, que ficou mundialmente conhecido pelo "Relatório Stern", apresentou no auditório da FIESP uma interessante palestra sobre mecanismos de mercado destinados a estabilizar as emissões de CO2 e conter as tão discutidas mudanças climáticas. Os debates que se seguiram à palestra não estiveram à altura desta, perdendo-se tempo com questões superficiais e com uma burocrática e pouco convincente defesa da política ambiental do governo. Feita pela representante do Ministério do Meio Ambiente, deixava de lado questões substantivas como, entre outras, o conflito entre os interesses imediatos da indústria automobilística e a urgência de se tomarem medidas vigorosas para conter drasticamente e em curtíssimo prazo as emissões de CO2.
Como se sabe, o setor de transportes responde por uma fatia ponderável dessas emissões, de modo que a gradativa substituição do transporte individual pelo coletivo contribuiria para í-las diminuindo sensivelmente. Perdemos a oportunidade de ouvir a opinião de Sir Stern sobre esse tema e, eventualmente, os comentários dos representantes da Fiesp, da CNI e da CPFL, que fizeram intervenções importantes nos debates.
Ainda nos debates, um dos participantes da mesa afirmou que "hidrelétricas emitem mais gases de estufa do que termelétricas", causando certo desconforto a uns poucos profissionais do setor elétrico, que estavam na platéia.
É verdade que hidrelétricas emitem gases de estufa, mas aquela afirmação foi equivocada, se não vejamos:
Dado o balanço de massas da reação de combustão do gás natural (essencialmente metano), uma termelétrica de 1.000 MW de potência elétrica e eficiência termodinâmica de 0,50 (semelhante à Piratininga, por exemplo), operando com gás de mesmas características daquele fornecido pela Petrobrás, emite 7.392 toneladas de CO2 por dia, se operar com fator de capacidade igual a 0,80. Ora, são raríssimas as hidrelétricas que emitem tudo isso, mesmo num mês inteiro.
As emissões das hidrelétricas vêm, quase todas, da decomposição de material orgânico remanescente no fundo dos reservatórios, com liberação principalmente de metano, que se dissolve na água. Durante o funcionamento da hidrelétrica, boa parte dessa água passa pelas turbinas e sai borrifada em gotículas de gases dissolvidos. Esse aerossol, por assim dizer, é aspergido até uma distância de 10 a 15 metros da saída dos túneis de descarga.
Há, ainda, as emissões provenientes do uso de combustíveis fósseis na construção da hidrelétrica e na fabricação e transporte de seus componentes eletro-mecânicos, mas estes só ocorrem durante a implantação da obra.
As emissões de gases dissolvidos podem ser muito reduzidas por cascas (lâminas delgadas) de concreto armado, construídas justapostamente, em posição inclinada, sobre a saída dos túneis de descarga, com a finalidade de interceptar e devolver as gotículas ao curso d’água, a jusante. A fração restante não causa grandes impactos porque, embora seja 22 vezes mais opaco às radiações infravermelhas do que o CO2, o metano decompõe-se muito mais rapidamente do que este. De resto, a presença de gases dissolvidos nos reservatórios seria bem menor se os responsáveis pela construção de hidrelétricas desbastassem previamente as áreas a serem inundadas e removessem toda a madeira e resíduos orgânicos para locais não inundáveis.
Além disso, nas estações secas, quando cai o nível dos reservatórios, o lodo e resíduos vegetais acumulados nas orlas deveriam ser removidos. Em seguida, para evitar que esse material se decomponha ao ar, emitindo metano, pode-se compostá-lo e, em função de estudos agronômicos a serem feitos caso a caso, aproveitá-lo como fertilizante em plantações circunvizinhas. Se essas orientações tão simples fossem adotadas, as emissões dos reservatórios hidrelétricos ficariam reduzidas à escala das emissões de qualquer lago natural.
Cabe, por fim, assinalar que as concessionárias de aproveitamentos hidrelétricos deveriam ser as maiores aliadas das florestas, uma vez que a derrubada destas comprometeria o regime hidrológico, com sérias perdas para a própria geração hidrelétrica.
Joaquim Francisco de Carvalho foi engenheiro da CESP e presidente do IBDF (atual IBAMA)
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