Para não perder o prazo
- Detalhes
- Andrea
- 04/04/2008
Em agosto de 1954, o encontro anual do movimento Economia e Humanismo teve que ser suspenso porque o suicídio de Vargas fizera a massa popular tomar as ruas da cidade com tal violência que a própria polícia achou melhor recolher-se aos quartéis.
Sob impacto dessas manifestações, um grupo de democrata-cristãos reuniu-se com o diretor de Economia e Humanismo, Padre Lebret, para uma análise da situação.
Meio século depois, as palavras de Lebret merecem ser reproduzidas. Disse ele:
"Trata-se de um povo infantil que está chorando a morte do pai. Hoje, se alguém lhe parecer culpado dessa morte, será trucidado. Mas a massa que está nas ruas não tem projeto político, de modo que toda a energia que está despendendo nas manifestações se esgotará nesses atos de vandalismo. Se houvesse, hoje, um partido comunista organizado, tomaria o poder. Como não há, a massa vai se cansar e voltar para casa".
Em seguida, Lebret sugeriu uma estratégia aos democrata-cristãos: "Essa massa que está chorando a morte de Vargas buscará novo pai. Um candidato a esse posto é o demagogo que vocês puseram no governo de São Paulo (referia-se a Jânio Quadros). Se ele não emplacar e se os democratas não oferecerem uma alternativa aos governos oligárquicos ou populistas, dentro de dez anos, o país estará sob uma ditadura militar".
Ora, estas palavras foram proferidas em agosto de 1954!
Os democrata-cristãos de então não deram ouvidos a Lebret. Junto com os demais democratas e com os partidos de esquerda, entregaram-se ao mais desabrido eleitoralismo.
Dez anos depois, quando as contradições do regime burguês fizeram com que as massas populares saíssem novamente às ruas, não havia nenhuma proposta alternativa e nenhuma organização política suficientemente forte para captar a energia do povo. Resultado: vinte anos de ditadura militar!
A aparente calmaria dos tempos presentes não deve enganar ninguém. Mais dia, menos dia, as contradições da sociedade brasileira jogarão, de novo, as massas populares nas ruas. Nessa hora, uma fresta se abrirá na muralha do poder burguês - abertura fugaz, como é da natureza desses processos.
A esquerda dispõe de um prazo (contado em décadas) para preparar-se, a fim de que possa voltar à cena política apta a oferecer uma alternativa revolucionária. Se, nesse prazo, tiver conseguido adquirir real força, a política brasileira mudará de qualidade. Se não tiver sido capaz, novamente amargará outras décadas de marginalização do protagonismo político.
{moscomment}
Comentários
Assine o RSS dos comentários