O dilema das organizações do campo
- Detalhes
- Andrea
- 01/09/2008
Quem examinar atentamente as desapropriações que o INCRA tem feito nos últimos meses, verificará que todos os prédios desapropriados apresentam as mesmas características: são imóveis baratos; de baixo custo por família; que podem ser desapropriados com a anuência do agronegócio vizinho.
Ilude-se quem pensar que se trata de coincidência. Seu ministro da reforma agrária recebeu ordem para selecionar unicamente imóveis que satisfaçam esses três requisitos. Sem comprovação do cumprimento deles, não sai a famosa "canetada" - aquela tantas vezes prometida - que resolveria o problema de uma vez por todas.
Os movimentos do campo relutam em aceitar que o governo Lula tenha mudado definitivamente de lado. Como são aliados históricos do presidente, preferem poupá-lo e assestar as baterias unicamente no agronegócio. Sem dúvida, esse é mesmo o grande inimigo, mas ele não teria força para paralisar a reforma agrária se esta não fosse a determinação do presidente.
Os vários atos de protesto contra o agronegócio bateram na muralha do indiferentismo da massa rural e da população urbana - fato que a mídia utilizou amplamente a fim de indispor o povo contra a reforma agrária. Isto parece indicar que a tática não está correta.
A luta da reforma agrária não se desenvolve e nem é decidida exclusivamente no campo. Boa parte dos avanços obtidos em tempos passados foi o resultado de pressão de opinião pública exercida por setores urbanos, entusiasmados com a combatividade desses movimentos.
É certo que os tempos mudaram e que o estado de espírito da massa não é mais a conquista de direitos e, sim, a preservação dos já conquistados, o que favorece Lula naquilo em que ele é um mestre: a arte de utilizar a apatia da população para neutralizar focos de oposição real à sua política. Ele não discute com os opositores e também não os reprime. Deixa a repressão para os órgãos de repressão do Estado burguês porque sabe que eles não precisam de ordens específicas para operar. Ele simplesmente coopta os recalcitrantes potenciais, oferecendo-lhes compensações que terminam por amarrá-los.
Na conjuntura política atual, diante de uma opinião pública anestesiada, dificilmente um gesto explícito de rompimento com o governo teria repercussão, parecendo, portanto, que esta não seria a melhor tática para os movimentos populares do campo.
Com efeito, há, em toda disputa, situações em que as condições objetivas exigem a ambigüidade e a contemporização. Nesses casos elas constituem táticas eficazes. Mas a eficácia desse tipo de tática é sempre de tempo limitado. Se a ambigüidade e contemporização permanecem indefinidamente, debilitam-se os princípios que orientam a ação dos militantes e termina-se por abalar sua auto-estima.
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Comentários
Belo Horizonte, 28 de novembro de 2005.
Caros(s) Companheiro(s)
De estradas e jornadas.
Depois do nosso último encontro em Belo Horizonte e devido o meu apoio à justa ocupação do INCRA pelo MST, concretizou-se o fato, há algum tempo já sinalizado que foi: o da crescente incompatibilidade entre a minha visão e o meu compromisso pessoal com os movimentos sociais e a orientação e prática da Instituição da qual eu representava, o que resultou na minha demissão do INCRA em setembro de 2005.
Desde então, procuro a oportunidade de uma reaproximação independente do poder do Estado, com representações organizadas existentes na sociedade civil que estejam comprometidas de alguma forma com a questão da Reforma Agrária, na mesma perspectiva ideológica que defendo e com uma prática que busque, realmente, a transformação social e política da realidade brasileira, há tanto tempo batalhada e esperada, embora malograda até o momento em nosso país.
Por isso, me dirijo ao(s) companheiro(s) agora apenas no papel de cidadão que sou e que sempre fui engajado com as forças sociais, para compartilhar meu sentimento de desaponto e estranhamento com a política do atual Governo, no qual garantimos a legitimidade e depositamos a nossa confiança, e que tem demonstrado um afastamento cada vez mais evidente dos anseios da maioria dos brasileiros que apostaram na sua capacidade política transformadora, em favor da justiça e da inclusão social.
Acreditando que, somente através de movimentos organizados de pressão social, possamos reverter o rumo secular da história de omissão do Poder Público em relação à desigualdade e a exploração econômica em nosso país, na qual a Reforma Agrária é questão crucial e a mais urgente, é que me coloco à disposição, com a minha experiência profissional e capacidade de trabalho, para somar esforços à causa política que sempre norteou a minha vida.
Em anexo, encaminho meu Currículo Vita, documento que atesta uma trajetória coerente e comprometida, em diversas frentes, com a luta pelo direito, pela dignidade e valorização do trabalhador brasileiro.
Contando com o seu apoio e a sua solidariedade nesse momento difícil que atravesso, por ter levado até as últimas conseqüências uma posição e atuação transparentes contra a política do INCRA ora em andamento, coloco-me à disposição para contribuir, de forma independente e desatrelada do Poder Público, com aqueles que continuam a lutar e acreditar, a par de tantas dificuldades e decepções, em uma sociedade mais justa e fraterna para a maioria do nosso povo, seja no campo ou nas cidades.
Esperando uma resposta favorável o mais urgente possível, despeço-me com um forte abraço, agradecendo antecipadamente.
Carlos Rodrigues.
(35) 91489864
cr29oi.com.br
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