Não transigir com princípios
- Detalhes
- Andrea
- 17/02/2009
As fotos em que aparecem assassinos, fraudadores do fisco, estelionatários de alto coturno, condenados pela justiça, mas tranqüilos, sorridentes, em viagens pelo mundo e em eventos sociais chocam e provocam justa indignação na opinião pública.
Acontece que todas essas pessoas estão protegidas por normas constitucionais que proíbem a detenção de pessoas que ainda não tenham sido condenadas em última instância pela prática de crimes, salvo nos casos previstos em lei.
Para corrigir essa situação certa mídia está propondo medidas, que aos leigos parecem corretas, mas que terminarão certamente anulando direitos e garantias individuais, essenciais para o funcionamento da democracia.
Senão, vejamos: o artigo 5°, letra LVII determina que: "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória".
Trata-se da presunção de inocência – um avanço civilizatório que custou séculos de lutas para ser inscrito nas leis constitucionais.
A enorme importância deste princípio pode ser aquilatada pelo seu inverso: a presunção da suspeição. Basta ver o estrago que o Patriot Act produziu na estrutura da democracia norte-americana. Agora, nos Estados Unidos, todos são suspeitos, até que provem o contrário. O resultado disso foram as prisões de Guantánamo e Abu Graib, que escandalizaram as consciências democráticas de todo o mundo, e que constituem hoje uma ameaça a todos nós, uma vez que nenhum de nós, em qualquer parte do mundo, está livre de ser considerado suspeito por um agente da CIA.
Para reforçar a presunção de inocência a norma do art.5°, letra LXVI reza: "ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança".
Recente decisão do Supremo Tribunal Federal exigindo o rigoroso cumprimento dessas normas provocou reação negativa – cautelosa, mas inequívoca - de certa imprensa. Chegou-se a dizer que isto representaria a libertação imediata de milhares de pessoas que estão presas à espera de julgamento - o que não corresponde, de forma alguma à realidade.
Qual seria o jeito certo e o jeito errado de solucionar esse problema?
Certo seria modificar a lei processual para fechar a porta dos recursos meramente protelatórios, acessíveis apenas aos réus que podem pagar caríssimos advogados; aumentar substancialmente o número de juízes, promotores e funcionários de cartórios, a fim de abreviar o tempo de tramitação dos processos; exigir de juízes, tribunais, promotores e cartorários rigor no cumprimento dos prazos do processo penal.
Como isto custa caro e o "establishment" burguês não está disposto a gastar dinheiro com a malta ignara que compõe a maioria dos presos à espera de julgamento, a mídia, alegando a impossibilidade prática de adotar a solução correta, está sutilmente optando pelo jeito errado: está sugerindo que o Supremo deverá interpretar as normas da Constituição de maneira restritiva, a fim de manter presa essa gente, antes da condenação em última instância, mesmo contrariando as normas constitucionais.
É preciso que o Supremo Tribunal Federal, que é guardião da Constituição, resista a este ataque ao Estado Democrático de Direito.
{moscomment}
Comentários
Assine o RSS dos comentários