Correio da Cidadania

Qual tipo de lista convém ao voto proporcional?

0
0
0
s2sdefault

 

Parece fora de dúvida, e até existe largo consenso entre os estudiosos do problema, que o mecanismo da “lista fechada” é o formato mais adequado ao sistema do voto proporcional. Ao mesmo tempo, como uma espécie de pêndulo, ele pode funcionar como contraponto radical no desmonte da cultura política constituída em torno da “lista aberta” utilizada no Brasil.

Nele, os partidos apresentam a lista dos seus candidatos antes das eleições, cabendo ao eleitor apenas votar na legenda. O eleitor vota no partido, que hierarquiza e ordena a lista dos seus representantes. O foco da escolha do eleitor se desloca da pessoa do candidato para os programas partidários. O efeito dominó provocado por esta alteração substancial se propaga pelo conjunto do sistema eleitoral: simplifica a apuração, desaparece a competição entre os candidatos da mesma agremiação, fortalece o sistema partidário, amplia a força e a responsabilidade dos partidos na seleção da lista de candidatos.

O perfil da campanha eleitoral também sofre o impacto radical da mudança. Ao invés de escolher entre milhares de candidatos individuais, o eleitorado escolherá entre dezenas de programas partidários. Além de estimular uma maior nitidez programática na disputa (a propaganda eleitoral será mais de propostas e menos de pessoas), a “lista fechada” é o mecanismo mais adequado para, na transformação de votos em cadeiras no parlamento, construir a proporcionalidade da representação política.

No entanto, dois argumentos fortes se contrapõem à adoção do sistema das listas fechadas. Um deles é o peso que passariam a ter as burocracias partidárias no ordenamento das listas, fato que leva ao receio justificado da cristalização ainda maior do domínio oligárquico. O outro é a tradição do eleitorado brasileiro, que não faz fé, com justificadas razões, em partido e prefere votar na pessoa do candidato. A primeira objeção pode ser atenuada com uma regulamentação que determine a realização de eleições primárias nos partidos para o ordenamento das listas. A segunda, mais complicada do ponto de vista político, talvez recomende alterações de fundo na proposta.

A alternativa seria a adoção de um sistema de “lista flexível”, onde o partido estabelece a ordem dos candidatos, mas seria dada ao eleitor a oportunidade de votar em um determinado nome da lista. O modelo adotado na Bélgica é assim. A embocadura da campanha e o perfil da disputa se estruturam a partir do embate entre programas partidários, abrindo espaços para o debate maior entre idéias e projetos e não entre personalidades. Como acontece entre nós, o eleitor ao votar pode escolher um candidato ou votar na legenda, que no caso será uma lista ordenada pelo partido. Para se saber quem foi eleito, divide-se o número de votos conseguidos pelo número de cadeiras conquistadas pelo partido, obtendo um quociente interno. Todos os candidatos que superarem este número, independente do lugar ocupado na lista partidária, estarão eleitos e, na seqüência, vale a ordem da lista até completar o número de cadeiras obtido.

O modelo belga de lista flexível tem a vantagem de não agredir da tradição do eleitor brasileiro, que continuará podendo votar no candidato ou na legenda, ao mesmo tempo em que altera profundamente os termos da disputa: campanhas centradas na disputa entre partidos e cultura do voto se deslocando para a lealdade aos valores, idéias e projetos.

 

 

Léo Lince é sociólogo.

 

Para comentar este artigo, clique {ln:comente 'aqui}. 

 

0
0
0
s2sdefault