Nicarágua: mais 5 anos
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- Gisela Brito
- 11/11/2016
No domingo passado, em 6 de novembro, houve as eleições na Nicarágua, para eleger presidente, vice-presidente, 90 deputados para a Assembleia Nacional e 20 deputados para o Parlamento Centro-Americano (Parlacen), que terão mandato de 5 anos a partir de 10 de janeiro de 2017.
O atual mandatário obteve a reeleição com um amplo apoio. Os resultados são os seguintes: a chapa Daniel Ortega/ Rosário Murillo se impôs com 72,5% - 10 pontos percentuais acima do resultado obtido em 2011 (62%). Em segundo lugar, ficou a aliança opositora: Partido Liberal Constitucionalista (PLC) com 15%; seguido pelo Partido Liberal Independente (PLI) com 4,5% dos votos; a Aliança Liberal Nicaraguense (ALN) ficou com 4,3% e o Partido Conservador (PC) com 2,3%. Por último, a APRE (Aliança pela República) obteve 1,4% dos votos.
Participação cidadã
Um dado chave destas campanhas é o da participação, posto que se elevou em um contexto de fortes questionamentos por parte de um setor da oposição que as qualificou como “farsa eleitoral”, convocando a população a se manifestar mediante uma abstenção massiva. Por outro lado, o oficialismo e seus aliados convocaram a cidadania a participar nas urnas e oferecer maior credibilidade à votação. Nenhum setor previa surpresas a respeito dos resultados favoráveis para o atual partido do governo.
Segundo o Conselho Supremo Eleitoral (CSE) participaram 68,2% dos cidadãos convocados às urnas. Cifra muito superior à que antecipavam diversas pesquisas, entre elas a da CID Gallup, empresa que opera em toda América Latina, segundo a qual a abstenção alcançaria 50% (1), pondo em xeque o juízo de qualidade da metodologia de algumas empresas para antecipar comportamento eleitoral.
Em comparação com eleições prévias, a porcentagem de abstenções nessas eleições (31,8%) foi inferior a de 2006 (34%) e a de 2011 (42%). E considerando que na Nicarágua o voto é voluntário, a porcentagem de participação se mostra relativamente alta, similar a de países da América Central com o mesmo sistema e muito superior a países da América do Sul, como Colômbia e Chile, onde o voto não é obrigatório (2).
Em definitivo, a convocatória à abstenção por parte da oposição não parece haver influído na participação, pois a maior parte do povo nicaraguense se inclinou a exercer seu direito ao voto e não acompanhou a oposição na tentativa de deslegitimar as eleições por essa via.
Não obstante, este dado pode ser questionado, posto que existem controvérsias a respeito do cálculo, que segundo setores da oposição não se realiza sobre o universo total dos votantes, mas sobre o que o CSE denomina “padrão real”, que exclui aqueles que não tiverem participado nas últimas três eleições. Este padrão está formado por 3,78 milhões de cidadãos, enquanto o universo total de votantes (ou padrão “ativo”) é de aproximadamente 4,34 milhões de cidadãos.
Setores minoritários da oposição, aglutinados na Frente Ampla pela Democracia (FAD) e Cidadãos pela Liberdade, que não participaram das eleições, desconheceram os resultados e difundiram diversos informes com cifras imprecisas e de duvidosa procedência sobre a abstenção, que rondaria entre 17% e 80%.
Qualidade e transparência das eleições
Esta questão, assim como também a negativa a acreditar missões de observação eleitoral internacionais e os recentes movimentos do governo para debilitar a oposição, foi motivo de questionamentos à qualidade das eleições. É o caso da controversa destituição da Assembleia Nacional de 28 deputados opositores, que constituiu um processo fundamentado em procedimentos legais (e em uma sentença do Tribunal Superior de Justiça) e motivou um setor da oposição a decidir retirar-se da disputa, pondo em questionamento a legitimidade das eleições.
No que se refere à transparência das campanhas, a jornada da votação foi monitorada por especialistas eleitorais de diversos países da América Latina, representantes da Organização de Estados Americanos (OEA) e acompanhantes internacionais entre os quais constam os ex-presidentes Álvaro Colon (Costa Rica), Mauricio Funes (El Salvador), Fernando Lugo (Paraguai) e Manuel Zelaya (Honduras). Segundo todos os relatórios de observadores internacionais, as eleições transcorreram com normalidade e sem incidentes (3).
Parlamentares
Quanto aos resultados das eleições de deputados, ainda não foi feito o cálculo exato da quantidade de cadeiras obtidas por cada força. Em porcentagens, os resultados foram os seguintes:
Eleição de deputados nacionais: FSLN com 66,8% dos votos; seguida por PLC (14,7%), PLI (6,6%), PC (4,3%), ALN (5,6%) e APRE (2,2%).
Eleição de deputados departamentais: FSLN com 65,7% dos votos; seguida por PLC (15,3%), PC (4,5%), ALN (5,6%), PLI (4,8%), APRE (2,9%) e YATAMA (1,2%).
Eleição de deputados para o Parlacen: FSLN com 68,6% dos votos; seguida por PLC (14,13%), PLI (5,7%), ALN (5,5%), PC (4,3%) e APRE (1,8%).
Mais cinco anos
Com esta vitória, a FSLN se robustece em sua posição de força política hegemônica no país. Esta hegemonia se sustenta em uma ampla rede de alianças que o governo de Daniel Ortega mantém com outras forças políticas, de diversos signos ideológicos, com parte do movimento sindical e com o setor privado, a fim de apoiar um modelo de desenvolvimento que nos últimos dez anos transformou a fisionomia do país.
Em claro contraste com o que acontece em países vizinhos, a Nicarágua se destaca pela ausência de elevados índices de violência e de migração massiva aos EUA.
Na área econômica o país manteve na última década altas taxas de crescimento que se traduziram em uma forte redução da pobreza e em melhorias estruturais para a população, mediante a implementação de uma política social inclusiva (4).
Ainda em um contexto de restrição, no período entre 2009 e 2014, a pobreza foi reduzida em 13 pontos percentuais (de 42,5% a 29,6%) segundo o Instituto Nacional de Informação de Desenvolvimento (5). Dados da Fundação Internacional para o Desafio Econômico Global (Fideg) indicam que no mesmo período o consumo per capita dos lares mais empobrecidos cresceu em um maior ritmo que o do resto dos lares, o que aponta para o “crescimento inclusivo e favorável para os pobres” (6).
Notas:
(1) Pesquisa CID Gallup.
(2) Por exemplo, nas últimas eleições presidenciais do Chile (2013) a participação foi de 49,36% e nas da Colômbia (2014) de 40,65%.
(4) Eleições na Nicarágua: a economia em tempos de Daniel Ortega
Gisela Brito é pesquisadora da Celag (Centro Estratégico Latino Americano Geopolítico).
Traduzido por Raphael Sanz, do Correio da Cidadania.