Guatemala se dobra à pauta de Trump na questão dos migrantes
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- Elaine Tavares
- 13/02/2020
Desde o mês de outubro do ano passado, os centro-americanos encontraram uma nova maneira de migrar. Eles não vão mais sozinhos, mas em colunas gigantescas, de até quatro mil pessoas ou mais. As marchas migrantes atravessam países e seguem rumo ao que acreditam ser a “terra das oportunidades”: os Estados Unidos. As famílias, sem contar com a ação dos Estados de origem no que diz respeito à possibilidade manter a vida, partem, com seus velhos e crianças tentando outra sorte.
As primeiras caravanas, por serem inéditas e chamarem a atenção do mundo, acabaram obrigando o governo do México a oferecer ajuda. Mas, com o passar do tempo e a pressão dos Estados Unidos, o país comandado por López Obrador rendeu-se e passou a impedir a passagem dos migrantes, o que tem obrigado as colunas a encontrar outras formas de atravessar a fronteira. É um drama de grande magnitude, que não encontra muito apelo na mídia comercial.
Guatemala, El Salvador e Honduras são os países de onde mais saem migrantes, premidos pela violência, a criminalidade, a miséria e a completa falta de expectativa. Na última semana o presidente dos Estados Unidos se reuniu com os mandatários de cada um desses países na tentativa de contar com seu apoio para impedir a saída das caravanas, no que foi prontamente atendido. Mas esse impedimento é apenas o da força, porque nenhum dos países da América Central está disposto a virar o jogo e encerrar séculos de dependência e subordinação, que é o que ocasiona tanta miséria para a maioria.
As propostas encontradas beiram a mais absoluta crueldade. Como o convênio de Cooperação e Asilo firmado no último dia 7 de fevereiro pelo presidente da Guatemala, Alejandro Giammattei, e Trump, que abrem falsas janelas para os trabalhadores guatemaltecos entrarem “legalmente” nos EUA. O acordo prevê vistos temporários para pessoas que queriam trabalhar na agricultura dentro dos Estados Unidos. Esses documentos serão mediados por empresas estadunidenses que serão as que contratarão os trabalhadores. Óbvio que isso vai tocar em uma parcela muito pequena da população, mas a mídia faz o estardalhaço de sempre, alegando que com essa medida o presidente está estimulando a imigração legal. O que é uma deslavada mentira porque os vistos são temporários, portanto, não é uma migração, apenas uma situação passageira que, pode, isso sim, levar a uma imigração ilegal.
Além disso, o acordo faz da Guatemala um posto de recebimento de migrantes ilegais. Todos os centro-americanos que forem detidos na fronteira com os EUA serão deportados diretamente para lá, aumentando assim o número de pessoas desesperadas e sem ocupação. Só no ano de 2019, quase 400 mil migrantes foram barrados nos postos de fronteira com os Estados Unidos e quase 60% deles acabaram detidos. Várias lideranças política se colocam contrárias a esse acordo, pois entendem que a Guatemala sequer consegue dar conta de seu próprio povo, e não terá como cuidar dos deportados.
Na coletiva que deu à imprensa guatemalteca Alejandro Giammattei informou que a conversa com Trump incluiu a preocupação com o que chamou de “países não-livres”: a Venezuela, Cuba e Nicarágua. Por não-livres, é claro, entende os que não se dobram aos interesses dos Estados Unidos. Também contou que pretende, a pedido de Trump, fortalecer os laços com Israel e que a Guatemala deverá declarar o Hizbolá como uma organização terrorista. Ou seja, fica claro que a reunião com Trump mais teve a ver com as pautas do presidente estadunidense do que com os interesses do povo da Guatemala.
Já sobre o acordo que garantirá a exportação de mão-de-obra “legal” não deu muitos detalhes, informando que tudo será preparado pelas empresas estadunidenses. Ou seja, mais ilusão para a população e nada de mudança no plano interno.
Elaine Tavares é jornalista e colaboradora do Instituto de Estudos Latino-Americanos da UFSC, onde o artigo foi originalmente publicado.