Correio da Cidadania

Jornalista é executado na Guatemala após pedir renúncia de Giammattei

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Quién era Frank Ramazzini?
Apenas 16 horas após defender a renúncia do presidente da Guatemala, Alejandro Giammattei, o jornalista Frank Stalyn Ramazzini Véliz foi executado a tiros durante um ataque, sexta-feira (9) à noite, numa discoteca ao norte da capital. Escolhido recentemente presidente da Associação Fiscalizadora Pró-Justiça e Direitos Humanos do país centro-americano, Frank tinha uma trajetória reconhecida. Ferido no braço e na perna, ele já havia sobrevivido a um atentado em julho de 2018, ocorrido após participar de uma passeata para exigir melhores condições para a Polícia Nacional Civil (PNC) e guardas do sistema penitenciário.

Na discoteca, outras três pessoas morreram (William Ernesto José Sical, 43 anos; Dener Andres, 19 años; e José, 40 anos, sem sobrenome divulgado) e outras duas ficaram feridas, recordou o ombudsman Jordán Rodas, “condenando o assassinato de Frank Stalyn Ramazzini, ativista, crítico do governo da Guatemala e defensor dos direitos humanos”. Segundo Rodas, o jovem era popular pela defesa dos direitos sociais e trabalhistas. De acordo com a imprensa local, Frank também vinha acumulando prestígio por denunciar a corrupção no governo, especialmente no Ministério de Governo.

“Frank Ramazzini, um jovem ativista e jornalista independente, acaba de ser assassinado na Guatemala. O responsável é o governo. Suas mensagens ficarão na nossa memória, não o calaram, um dia teremos o país que ele sonhou”, declarou a ex-procuradora-geral Thelma Aldana (2014-2018), que se encontra exilada nos Estados Unidos. Aldana foi responsável pela investigação contra o ex-presidente Otto Pérez Molina, seu vice-presidente e vários membros de seu governo por um caso de fraude na alfândega.

O jovem ativista ficou conhecido por questionar e criticar fortemente as ações do atual presidente guatemalteco, a quem reprovou pelos danos à economia devido à inação durante a pandemia de Covid-19. “Toda a Guatemala está esperando a rede nacional de hoje, pedindo a Deus que Alejandro Giammattei renuncie”, foi uma das últimas mensagens que escreveu em sua página no Facebook. Na oportunidade, criticou a política de fome e desemprego aplicada contra os que ainda “sobreviveram à pandemia”, anunciou não temer ameaças e que compareceria “com restrições ou não” a uma manifestação neste sábado (10) para exigir a renúncia do presidente. Não teve tempo, foi executado.

Crime anunciado

Em dezembro de 2020, o jornalista explicitou com nome e sobrenome que responsabilizava Giammattei; o ministro de Governo, Gendri Reyes; e o diretor do ministério, Luis Rodolfo Escobar Ovalle, por qualquer dano que viesse a ser causado à sua integridade física. “Estou enviando conversas e gravações de chamadas a vários administradores de páginas. Caso algo me aconteça, que façam chegar por via legal às instituições correspondentes, para que possam ser realizadas investigações. Peço as vossas orações e a qualquer deputado que honra as calças que veste para que me ajude a convocá-los, solicitando as investigações que cabem ao Congresso”, registrou o jornalista.

Em comunicado a Frente Fogo (Grupo Estudantil da Universidade de San Carlos) apontou que Frank “foi assassinado” por Giammattei e por Gendry Reyes. “Responsabilizamo-los pelo atentado contra um defensor dos direitos humanos e exigimos sua renúncia”, assinalou a Frente.

Na mesma linha, a poetisa Carolina Sarti levantou a voz. “Frank Ramazzini foi assassinado com armas de alto calibre. Ele denunciou e responsabilizou três altos funcionários por ameaças e sua possível morte. Ninguém deve ser morto por falar abertamente contra a corrupção ou por falar o que pensa. Que época sombria. #RenunciaGiammattei”.

O Ministério Público informou que foi localizado um carro próximo ao local com três pistolas, dois fuzis e uma submetralhadora, além de quatro coletes à prova de balas. O material teria sido confiscado e levado ao Instituto Nacional de Ciências Forenses (Inacif) para análise.

Ataques se multiplicam

Um relatório da Unidade de Organizações Não-Governamentais (ONGs) de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos da Guatemala (Udefegua) observou um crescimento dos ataques contra ativistas sociais desde 2020. “O primeiro ano de governo de Alejandro Giammattei representou o aumento mais forte e profundo dos ataques a defensores dos direitos humanos”, denunciou a organização, ao comparar as últimas sete administrações presidenciais. Apenas no ano passado foi registrado um número histórico de 1.055 incidentes destes incidentes, incluindo 17 assassinatos.

Para Julio Coj, dirigente da União Sindical de Trabalhadores da Guatemala (Unsitragua), “a situação do país é extremamente grave, porque há impunidade na sangria de milhões de dólares dos cofres públicos, como foi evidenciado recentemente nos casos de corrupção que o governo quer silenciar”. “Foi assim na compra de kits vencidos para testes de coronavírus. Mas os guatemaltecos que denunciam o assalto, aqueles que se empenham na defesa do patrimônio comum e dos direitos humanos, vêm sendo alvo de perseguição e criminalização, ainda mais na administração de Giammattei. Neste governo, os corruptos ampliaram enormemente a sua participação, tomaram conta, passando a deter muito maior controle do aparelho de Estado”, descreveu o sindicalista.

Entre as inúmeras vítimas, Julio Coj citou o apresentador Bryan Leonel Guerra, do canal TL, falecido em março do ano passado vítima de um ataque armado, que lhe deixou graves feridas no intestino, no fígado e no estômago. Vice-presidente da Rede de Comunicadores Sociais de Chiquimula, Bryan havia alertado as autoridades sobre as ameaças. Mas nada foi feito.

A Associação dos Jornalistas da Guatemala (APG) lançou um documento defendendo que é de “suma importância que o Ministério Público atue com plena independência e dê uma informação concreta ao povo sobre quem esteve por trás destes crimes e ao mesmo tempo se apurem responsabilidades”.

Diante disso, os jornalistas pedem à população que “manifeste das mais diversas formas a condenação a estes assassinatos”, exigindo a apuração do sucedido e se proceda a “desarticulação dos grupos paramilitares”.

Segundo pessoas próximas à família de Frank, não houve velório antes do enterro por medo de possíveis ataques.

Leonardo Wexell Severo é jornalista.

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