Correio da Cidadania

Boric: “Chile se reencontrará com o caminho da independência, da soberania e dos direitos”

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Na reta final para as eleições de domingo (21), em meio ao quadro de pandemia e um processo constituinte a pleno vapor, seis dos sete candidatos à presidência terminaram suas campanhas, na quinta-feira (18), com uma certeza: é preciso derrotar o fascismo. Já a extrema-direita adepta da repressão e da ditadura, dos campos de concentração e da desnacionalização, do neoliberalismo atroz, do arrocho salarial e do desaparecimento de direitos tem nome e sobrenome: José Antonio Kast.

Mais do que uma convicção na fala dos candidatos dos mais diferentes matizes, o repúdio ao retrocesso revelou-se uma unanimidade entre todos os demais. Alguns até pelo mais descarado oportunismo, como o indicado do presidente Sebastián Piñera e ex-presidente do Banco do Estado, Sebastián Sichel, que fechou a campanha na Praça Dignidade. O local, no centro de Santiago, foi o epicentro das mobilizações sociais onde mais de um milhão de chilenos, exigindo a construção de um país democrático, conseguiram extrair a Convenção Constituinte. Por defenderem suas ideias, muitos tiveram decretado o fim das suas vidas, foram cegados por balas de borracha ou bombas dos Carabineros, a Tropa de Choque do governo, ou ainda permanecem atrás das grades como presos políticos.

Diante de tantas atrocidades, o fato é que há um entendimento na sociedade chilena de que o novo governante necessita de um projeto que some, dialogando com o resultado da Convenção Constituinte, que tem se revelado um processo extremamente rico e esperançoso. Um movimento amplo e plural que em uma única mesa aproxima mais de 1.700 entidades e organizações, como é o debate ambiental. Uma reflexão que aponta para a construção de um país que deixe de ser uma economia de serviços e exportadora de recurso naturais, dependente, com um Estado reduzido a nada enquanto tudo é privatizado: água, saúde e educação.

Quem melhor incorpora esta bandeira de transformação, segundo pudemos perceber e conforme as últimas pesquisas, é o oposicionista Gabriel Boric, com quem estivemos na cidade de Casablanca, de pouco mais de 20 mil habitantes, a cerca de 70 quilômetros da capital. Diante de uma militância empolgada na Praça de Armas, o candidato do Aprovo Dignidade, uma frente ampla integrada pelo Partido Comunista, esteve ao lado de dirigentes sociais e personalidades como a ex-candidata presidencial e atual constituinte, Beatriz Sánchez.

No próximo domingo, assinalou Boric, “o Chile terá de escolher entre duas alternativas que são muito distintas. Uma que, por um lado, nega direitos e discrimina, que quer fechar o Ministério da Mulher e o Instituto Nacional de Direitos Humanos, que discrimina mães solteiras, que discrimina a diversidade sexual. Do outro lado está a nossa candidatura, que promete mudanças ambiciosas. Não será fácil, mas será feito com responsabilidade, passo a passo e criando maioria”. De acordo com Boric, Aprovo Dignidade é uma força da qual “temos que estar profundamente orgulhosos e orgulhosas, porque não é uma aliança colada com chiclete por motivos eleitorais, mas porque viemos das lutas sociais que mobilizaram este país durante as últimas décadas”.

Fortalecendo um movimento “popular, democrático e antifascista”, Gabriel Boric disse que sua “campanha está demonstrando que os trabalhadores e os povos temos futuro, estamos construindo uma alternativa e vamos nos reencontrar com o caminho que nos cortaram em 1973 [com o golpe contra o presidente Salvador Allende e a instalação da ditadura de Pinochet], vamos nos reencontrar com o caminho da independência, da soberania, dos direitos dos trabalhadores”.

Condenando a linha beligerante, o candidato do Aprovo Dignidade ressaltou que “Antonio Kast promove o uso de armas de fogo, sendo tremendamente irresponsável”. “A violência não pode ser a resposta para os problemas que temos no Chile. Por isso, conclamo que sejamos responsáveis. Essas posições de Kast precisam ser investigadas”, disse.

Quando estamos na política, ponderou Boric, temos de falar sobre as preocupações reais da população. “Temos de falar sobre o medo que o povo tem de perder o emprego. Tem medo de que sua pequena empresa quebre. Tem medo da delinquência. Esse medo quem tem que resolver somos nós e com boas políticas públicas. Não com violência, mas garantindo direitos. Não podemos negar que há motivo para essas preocupações e que vivemos um momento econômico difícil. Por isso temos de crescer de maneira verde, ecológica, feminista e, também, distribuir melhor”. O fato, ressaltou, é que “um país fraturado socialmente tem dificuldade para crescer”.

Questionado pelo ComunicaSul sobre a relevância da integração latino-americana em seu programa de governo, Boric sublinhou que este foi um ponto bastante presente em sua campanha, pois “frente à crise da pandemia, à crise migratória, à crise climática, nenhum país pode salvar-se sozinho”.

“Temos de promover a cooperação entre os povos. Queremos que na América Latina e no sul global, sejamos capazes de contribuir com nosso grão de areia para esses desafios que exigem, sobretudo, união. Que enfrentemos esses desafios em conjunto e não competindo”.

Nesta campanha, enfatizou o líder oposicionista, “muitas vezes o trânsito entre o temor e a esperança é estreito”. “É dever nosso falar dos temas que preocupam a população. O Estado chileno tem sido ineficaz em enfrentar o narcotráfico, que avançou sob Piñera. Temos que expor nossas ideias com clareza: queremos garantir direitos sociais para todos. Basta de fazerem negócio com nossos direitos. Uma aposentadoria digna é inegociável para nós. Um sistema de saúde que não seja bom só para os ricos. O presidente tem de transferir seu poder aos territórios”, finalizou Boric.

Única candidata mulher, Yasna Provoste, da Democracia Cristã (DC), encerrou sua campanha na Praça da Independência de Concepción, assegurando que, ao lado de seu governo, saberá “como reconstruir o país depois deste governo, o pior de todos”.

O representante do Partido Progressista (PRO), Marco Enríquez-Ominami declarou que há o risco “de que passe ao segundo turno um extremista de direita” e chamou o voto para derrotar de vez a Kast, a quem chama “o doutor medo”.

Em nome da União Patriótica, Eduardo Artés, agradeceu “a todos os que deixaram os pés nas ruas, que são os responsáveis por este grande triunfo que estamos conquistando”. Na Praça de Armas de Santiago, apareceu um cartaz com a figura de José Antonio Kast que dizia “atreva-se a pendurar o fascismo”.


Esta reportagem foi elaborada pelo Coletivo ComunicaSul, com o patrocínio do Barão de Itararé, Agência Carta Maior, jornal Hora do Povo, Diálogos do Sul, Apeoesp Sudoeste Centro, Intersindical, Sintrajufe-RS, Sinjusc, Sindicato dos Bancários do RN, Sicoob, Agência Sindical e 152 contribuições individuais.

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