Após amargar revés da “Lei Ônibus”, Milei acusa deputados de “conjunto de delinquentes”
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- Leonardo Wexell Severo e Mariano Vázquez
- 22/02/2024
Presidente Javier Milei sofreu dura derrota no Congresso nesta terça-feira (AFP)
Após a aprovação do pacote de maldades, agressões a direitos e à soberania nacional, embalado como “Lei Ônibus”, o presidente da Argentina, Javier Milei, amargou uma profunda derrota na Câmara dos Deputados, que decidiu voltar a apreciar o conjunto das medidas.
Conforme o regimento do Congresso, não há possibilidade do projeto ser votado em particular nas comissões, como defendido por deputados da base governista, fazendo com que retornasse à votação por completo.
O fato é que o Milei candidato havia proposto em campanha uma reforma econômica que recairia sobre uma suposta “casta”. Quando sua proposta se materializou em lei, os cortes desabaram com peso sobre os setores mais vulneráveis, os trabalhadores e o empresariado nacional.
“Este revés parlamentar é da exclusiva responsabilidade da sua incompetência, falta de diálogo e falta de vontade de construir consensos”, apontou o deputado federal Nicolás Massot, da bancada Fazemos Coalizão Federal (HCF), para quem as declarações de Milei contra parlamentares da sua própria base “recorda as épocas mais obscuras da história contemporânea”.
Para Mercedes Cabezas, secretária-geral adjunta da Associação dos Trabalhadores do Estado (ATE), com isso “a queda da lei foi completa com a sua aprovação perdendo completamente o efeito”. “O que significa? Que não houve acordo e tudo deve estar dentro do estabelecido constitucionalmente”, declarou a dirigente do maior sindicato de servidores públicos da Argentina. “Eles nos reprimiram durante três dias e aqui estamos. Nos atacam nas redes sociais e na via pública e aqui estamos. Eles cortaram medicamentos. Querem privatizar o Estado, de novo. A desumanização é total e absoluta. Mas a violência nunca é o caminho. Aqui estamos! O país não se vende!”, enfatizou.
A proposta ultraneoliberal, que prevê a privatização de setores estratégicos, a estrangeirização da terra, o assalto à Seguridade Social e o desmonte da cultura, vinha sendo fatiada. Na sexta-feira, 2, o governo retirara 382 artigos do pacote das mais de 600 medidas, na tentativa de garantir que passasse.
Repudiando a proposta de Milei, o povo foi às ruas. Parlamentares e governadores trouxeram a força da pressão ao Congresso e a situação mudou de figura. A mobilização fez com que a vitória de Milei no primeiro round se transformasse numa derrota no segundo. Isso projeta o novo confronto para o mês de março.
Parlamentares reclamam da “ingratidão e total deslocamento de Milei”
Para o deputado Julio Cobos, da União Cívica Radical (UCR), as declarações de Milei contra parlamentares da sua própria base são “um sinal de ingratidão e total deslocamento”, ainda mais ao “incitar ao ódio que pode gerar violência”. “Onde está a anunciada liberdade? É lamentável”, acrescentou Pablo Cervi, para quem o presidente deveria começar a “se dedicar a governar, porque há limites e códigos”. Também da UCR, Martín Tetaz foi ainda mais contundente: “lamentável e fascista”.
Compondo a ampla frente de resistência ao retrocesso, o secretário geral adjunto da Central de Trabalhadores da Argentina (CTA Autônoma), Ricardo Peidro, defendeu o fortalecimento da articulação e da mobilização. “Não permitiremos que a crise econômica seja usada como desculpa para destruir todos os direitos e a soberania argentina. Foi o que demonstramos na Greve Geral no dia 24, nas ruas. Continuaremos nos mobilizando para deter a voracidade das transnacionais contra o nosso povo”, ressaltou.
De Israel, Milei esbravejou contra os parlamentares qualificados de “um conjunto de delinquentes que querem uma Argentina pior”, “traidores” e “extorsionistas”. Completamente desequilibrado, o presidente que admite conversar com seu cachorro morto, também deu OK a vários tweets que tratavam os peronistas como “pedófilos” e “estupradores de crianças” e os radicais como “as putinhas do peronismo”.
A votação parlamentar foi um banho de realidade política para um governo e deputados que esbanjam amadorismo e desconhecem os procedimentos parlamentares. La Libertad Avanza – coligação de Milei- é a quarta minoria no Congresso e não poderá aprovar leis sem votos e sem acordos. Ainda mais com a população crescentemente insatisfeita com a disparada do desemprego, do brutal arrocho salarial e da completa ausência do Estado, como ficou caracterizado recentemente na “Fila da fome”. Tais componentes deixam a famigerada Lei Ônibus – que voltou à estaca zero – cada vez mais frágil.
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Leonardo Wexell Severo e Mariano Vázquez são jornalistas.
Publicado originalmente em Hora do Povo.