Política externa dos EUA recicla sua agressividade na América Latina
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- Pietro Alarcón
- 11/08/2009
Os enfoques críticos, do ponto de vista jurídico e político, sobre as graves conseqüências para a criação de um ambiente de paz e segurança na América Latina que seriam ocasionadas com a instalação de bases ou instalações militares em território colombiano pelos Estados Unidos não somente são inteiramente válidos como convocam reflexões de maior fôlego, em particular sobre o reconhecimento da etapa que atravessa o projeto de consolidação pós-guerra fria de um sistema internacional de poder sob a potência americana e, ainda, da situação da unidade continental.
A relação centro-periferia e o caráter da Pax Americana - que como aponta Pinheiro Guimarães em seus ‘Quinhentos Anos de Periferia’ é substancialmente diferente do projeto imperial Romano ou Britânico, porque não visa o bem-estar das províncias, senão a consolidação de um projeto hegemônico concebido militarmente - constitui um elemento claramente identificável na relação entre a Colômbia (de regime político que assegura, sob a presidência de Uribe, os interesses americanos na região) e a política externa americana.
Para aqueles que ainda têm constrangimentos em expressar com clareza que embora o governo Obama seja mais habilidoso e menos antipático que o imediatamente anterior - no que ajuda uma campanha expansiva de marketing e produção de informações em nome da defesa de valores universais indiscutíveis como o não ao racismo e o respeito pelas minorias para a recuperação urgente da legitimidade americana – estamos a falar do governo de uma potência que se auto-afirma pelo poderio militar. Esta parece ser uma demonstração clara de que os Estados Unidos não renunciam a projetar poder e lutar em defesa de seus interesses vitais caso a política de coibição fracasse sobre a base da concentração de forças.
Isso, como logo após será dito, não tem nada a ver, por exemplo, com o combate ao narcotráfico. Os Estados Unidos não precisam de desculpas, além da sua vocação agressiva, para instalar mais umas das suas 862 bases militares que espalharam pelo mundo. Resulta cômico como alguns articulistas de grandes meios de comunicação evitam utilizar expressões como imperialismo, política de poder, grandes potências ou equilíbrio de poder ao tecer análises sobre o tema das bases militares, quando a própria Condoleezza Rice – livre de toda e qualquer suspeita de guinadas à esquerda - em artigo publicado na Foreign Affairs em fevereiro de 2000, as utilizava com absoluta tranqüilidade para justificar que a busca do interesse nacional dos Estados Unidos conduziria o mundo à prosperidade e à democracia.
Para os Estados Unidos, como afirma Malcolm Sylvers, a segurança depende da sua força militar e econômica, e do uso da primeira e da situação da segunda depende a paz no mundo (Os Estados Unidos entre Domínio e Declínio, Campo das Letras, 2000).
E poder fazer a diferença e assumir sua condição hegemônica requer muito mais que leis de mercado ou controle econômico; implica também uma supra-estrutura política, jurídica e militar, com suporte em compromissos de governos aliados a essa proposta, tratados internacionais e, obviamente, bases militares.
No caso concreto, embora exista uma singularidade com relação à Colômbia, que vem desde o anúncio do Plano que leva o nome do país - Plano Colômbia, logo transformado em Iniciativa Regional Andina – o processo de reincorporação das áreas da América Latina consideradas fora da sua esfera de influência às estruturas do sistema internacional de poder sob a liderança americana sinaliza uma projeção militar ao eixo Caribe-Andes-Amazônia.
No plano civil, por assim dizer, os Estados Unidos apostam que os governos com projetos substancial ou medianamente diferentes de seus interesses nacionais sejam um parêntese. É dizer, programam o apoio a candidaturas para as primeiras magistraturas dos Estados - nos anos 2010 e subseqüentes - de forte compromisso com a renovação de laços muito estreitos em função dos valores americanos, sobre a base de um livre comércio favorável e um sistema financeiro ainda mais lucrativo.
Por essa via, apostam numa derrota de projetos populares que desmoralize a cidadania e converta as possibilidades democráticas nisso, em meras possibilidades. É dizer, atuam de modo decisivo para que projetos que se iniciaram não se consolidem, naufraguem em contradições internas e gerem conflitos nacionais.
De maneira que a reativação da Quarta Frota e estes exercícios militares não podem ser, como vêm apresentando vários meios de comunicação nacionais e internacionais, trivializados sob a ótica de que são naturais, ou de que se trata de mais uma tentativa de combate ao narcotráfico como proclamou o general e assessor da Casa Branca Jim Jones.
A reflexão do Banco Mundial sobre o conflito colombiano explica e muito a estratégia dos Estados Unidos. Parte-se da base de que na Colômbia existe um problema de governabilidade, que é solucionável militarmente, posto que, nesse raciocínio, a insurgência colombiana está debilitada militarmente e sua periculosidade deriva da sua capacidade de se rearmar contando com o autofinanciamento obtido do narcotráfico.
Historicamente tem-se discutido e levado a cabo duas tentativas de por fim ao conflito colombiano: o militar e a solução política. A saída militar tem sido sempre um fracasso. A solução política nunca madurou pela ação dos que em alguma época foram chamados por um Conselheiro para a paz na década de 80, como os inimigos entocados da paz. Essa solução política é perfeitamente possível, na medida em que se eliminem as causas reais da violência, se implementem reformais sociais e se abram horizontes à democracia garantindo o exercício do direito de oposição e à atividade do movimento social.
O problema do narcotráfico, como vários estudos comprovaram, não se resolve com presença militar no lugar onde se concentram apenas o 2% do altíssimo lucro que produz o negócio dos narcóticos. Isso significa, entretanto, mais fumigações e sofrimento para o povo colombiano. Enquanto isso, sob a premissa de combate, se deixam intactos os círculos financeiros nos quais circulam os narcodólares e intocados os paraísos fiscais e a lavagem de divisas, como já foi anotado por especialistas no tema.
Evidencia-se, destarte, que a política externa dos Estados Unidos reafirma, no âmbito de uma multipolaridade anunciada, mas contraditória e de difícil previsão, sua agressividade. Para tanto se coloca como força de expansão. Uma força autônoma de controle dirigida à região onde devem assegurar o predomínio da sua lógica econômica, comercial e financeira, ao tempo que se obstaculiza que os Estados da periferia possam desenvolver ligações entre si ou ligações com outras potências ou grandes Estados periféricos.
Finalmente, um dos elementos mais constantes na história das relações internacionais desde e para os Estados Unidos é procurar que os aliados internacionais partilhem os custos da sua política. O governo colombiano não foi à reunião da Unasul em Quito, que começou nesta segunda feira (11/08).
O custo político para o governo colombiano é extremamente elevado, ainda que alguns analistas pretendam baixar o tom dizendo que é um problema de relações públicas. Expressam que tudo se resolveria de início se o governo colombiano tivesse usado expressão diversa à de bases militares. Essa postura, em termos políticos e diplomáticos, que prioriza a forma à substância, é tão absurda como pretender ocultar o sol com as mãos. Na Colômbia costumamos dizer que é muito complicado logo que um elefante faz um estrago em uma loja de cristais que o porteiro da loja diga que não viu o elefante ingressar nela.
A preocupação com a sorte da paz é mais do que razoável. Não é possível duvidar, após conhecer a lógica dos impérios, da importância das bases em território colombiano para o projeto americano. A Colômbia foi enquadrada no projeto. Kissinger apontava há algum tempo o que parece previsível: "Os Estados Unidos, para evitar a hecatombe das forças locais nas quais terão investido seu próprio prestígio e tesouro, serão levados a tomar o terreno por si mesmos". (Does America Needs na Foreing Policy? El Espectador-Colombia. Junho de 2001. P.8) ) Explicava dessa maneira as etapas de trabalho militar americano em solos estrangeiros.
É importante acompanhar o desenlace das negociações e a reunião da Unasul, de maneira que a situação, que se torna excepcionalmente perigosa para a paz e a segurança, seja debatida em círculos amplos da opinião pública, e não nos cenários restritos da diplomacia ou da academia. Mais importante ainda é refletir com responsabilidade sobre o princípio da não ingerência, sobre o qual se erige todo o direito nacional e internacional e qualquer raciocínio no campo da política e da economia da sociedade de Estados. E é ainda mais fundamental a mobilização consciente pela paz e contra qualquer perspectiva de maior militarização da América Latina.
Pietro Alarcón é professor da PUC/SP, assessor do convênio Cáritas-ACNUR para refugiados e membro da CEBRAPAZ.
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Comentários
Obama fala com suavidade mas não tirou o porrete da mão. Ou como disse um amigo meu: dentro do Obama vive um Bush doido pra baixar o porrete. Parece que a Hilary Cliton é o porrete do Obama. Em outras palavras: a política exerna americana continua a mesma. E o Lula? Ah!O Lula acredita em Papai Noel.
Se alguém pensa que o Lula está fazendo mediação entre os EUA e a UNASUL, está enganado. Ele está do lado do Obama e fará tudo para enfraquecer Chavez e a ALBA. Afinal, ele é o "cara" do Obama. A vaiadade faz com que anões se sintam gigantes.
"Sed, invasión gota a gota", "The Revolution will not be televised", "War on Democracy". Todos eles podem ser baixados no www.docverdade.blogspot.com
Aproveitem!
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