América Latina – Rumo ao Terceiro Centenário
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- Grupo de São Paulo
- 09/11/2010
De 9 a 11 de setembro, Buenos Aires abrigou o IV Encuentro Internacional de Economia Política y Derechos Humanos promovido pela Universidad Popular Madres de Plaza de Mayo (UPMPM) e pelo Centro de Estúdios Económicos y Monitoreo de las Políticas Públicas (CEMOP).
O evento reuniu aproximadamente 1.200 pessoas – trabalhadores, intelectuais, organizações sociais e representantes de governos populares – vindas de diversos países. O tema deste ano foi América Latina 200 Años Hacia la Independência Econômica y la Justicia Social. Vários países da América Latina (Argentina, Chile, Peru, Venezuela, Colômbia) comemoram, este ano, seu bicentenário de independência conquistado contra o colonialismo de Espanha. O tema fez memória da luta conjunta pela autonomia de uma Pátria Grande sonhada por San Martin e Simón Bolívar (foi dividida pelos interesses das oligarquias coloniais e da metrópole).
O encontro teve início oficialmente com a tradicional marcha, que todas as quintas-feiras, às 15:30, as madres da Asociación Madres de Plaza de Mayo fazem na Praça de Maio, centro da capital Argentina. A associação foi criada pelas mães dos desaparecidos políticos que, com muita coragem, desde a ditadura afrontam governos, ditatoriais ou não, reclamando por justiça pelo crime cometido contra seus filhos e tantos outros jovens mortos e desaparecidos pela ditadura militar.
Atualmente as madres assumiram os ideais defendidos por seus filhos desaparecidos; além de manterem presente a memória histórica, dedicam-se também à educação, obras sociais e participação política. Com essa atitude, mantêm presente a luta e os ideais de seus filhos em favor da vida que lhes foi tirada pela ditadura militar. Nos espaços que geraram morte, elas estão construindo vida. A evidência mais expressiva deste fato é o Espacio Cultural Nuestros Hijos, localizado na ex-ESMA (Escuela de Mecânica de La Armada), centro clandestino de detenção e tortura da ditadura militar em Buenos Aires, hoje transformado em Museu da Memória.
O encontro proporcionou um expressivo espaço de debate sobre os problemas e os desafios atuais da América Latina. A troca de experiências, os relatos de realidades e as propostas para uma atuação conjunta dos povos latino-americanos ocorreram orientados pelos eixos principais do evento: A Nova Etapa da Crise Mundial, A Economia Social e os Movimentos Populares, Desenvolvimento Sustentável e Direitos Humanos, A Caminho do Novo Pensamento Econômico Latino-americano.
O IV Encontro motivou os participantes a pensarem os caminhos para o terceiro centenário da independência latino-americana frente a atual fase de dominação e avanço do capital financeiro, conhecida como Globalização. Ficou claro que, se nossos povos não continuarem a luta iniciada há dois séculos em busca da construção e emancipação da Pátria Grande, os sonhos de San Martin e de Simón Bolívar podem se converter em pesadelos.
A independência de nossas nações não é plena, continuamos dependentes e subjugados. A concentração de riquezas implica na concentração de poder. Comemora-se a independência frente aos antigos regimes coloniais, mas permanece a dependência frente ao imperialismo, em especial ao estadunidense. O povo latino-americano está sofrendo o peso de um modelo econômico, social e cultural (o capitalismo desenfreado, inumano e depredador) que jamais aprovaria se tivesse sido consultado. A América Latina está perdendo sua soberania quanto aos recursos naturais (água, minérios, biodiversidade) e quanto ao próprio território. Essa ameaça se dá no campo da economia e das idéias, mas especialmente no campo militar.
Atualmente, chega-se a falar na existência de 25 bases militares estadunidenses espalhadas pelo território latino-americano. Desde 2003, o Comando Meridional dos Estados Unidos organiza exercícios militares batizados de Panamax no corredor interoceânico da América Central e do Caribe. Em 2010, foi criada a Iniciativa Mérida, mais conhecida como Plano México (conta com um aporte de US$ 600 milhões destinado apenas ao patrulhamento da fronteira com o México, o que inclui o uso de aviões sem tripulação e envio de 1.500 homens para controle e patrulha).
Além dessas iniciativas, podemos citar outras: a ação realizada em Belize, onde o Comando de Operações Especiais dos Estados Unidos (US Socom) testa helicópteros sem tripulação e equipados com radares; a Missão SPS 2010 em Barbados; a atuação na Baia de Málaga na Colômbia ; a do Suriname sob o pretexto de intercâmbio de médicos militares estadunidenses especialistas em defesa contra catástrofes naturais; a intervenção no Haiti depois do terremoto de janeiro, chamada de missão "Novos Horizontes" (Adriana Rossi, ‘Costa Rica: um país pacífico que se arma’ –Le Monde Diplomatique Brasil, Set. 2010); e a reativação da IV Frota. A isso se soma o recente caso do Paraguai, onde o ministro da defesa nacional, Luiz Barreiro Spain, que se opunha à permissão de instalação de bases militares norte-americanas, foi destituído por pressão da embaixadora dos EEUU (vide: IV Encuentro ... Ponencia de Idilio Méndez Grimaldi. Periodista e investigador. Secretario de la Sociedad de Economía Política del Paraguay, SEPPY).
Há que se lutar contra todo esse poderio. Essa luta, mais que nunca, tem que ser continental. Os países latino-americanos necessitam unir-se para fazer frente ao imenso poderio das transnacionais e da expansão militar estadunidense para conseguirem uma verdadeira emancipação da Nuestra América. Mais do que nunca a América Latina tem que contrabalançar todo esse poderio através da união dos nossos povos em projetos como: a UNASUL (União de Nações Sul-Americanas); o Conselho de Defesa Sul-Americano; a criação de uma organização como a OEA, sem a participação do Canadá e Estados Unidos; o Banco do Sul; Programas Regionais de Saúde e outros.
O IV Encuentro Internacional de Economia Política y Derechos Humanos convocou todos a lutarem, mais uma vez, pela independência da Nuestra América a caminho do terceiro centenário. Este tem que ser o centenário do povo, dos trabalhadores e da união de forças. Nessa caminhada, os movimentos sociais exercerão papel fundamental. Sem as organizações populares e a conscientização de todos, não haverá justiça, soberania e sustentabilidade. Não haverá a Pátria Grande.
Elisa Helena Rocha de Carvalho, José Juliano de Carvalho Filho, Andrea Paes Alberico, Guga Dorea e Thomaz Ferreira Jensen, do Grupo de São Paulo.
O Grupo de São Paulo é um grupo de pessoas que se revezam na redação e revisão coletiva dos artigos de análise de Contexto Internacional do Boletim Rede, editado pelo Centro Alceu Amoroso Lima para a Liberdade, de Petrópolis, RJ.
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Artigo publicado na edição de outubro de 2010 do Boletim Rede.
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