Para consolidar a ‘Revolução Cidadã’, Correa precisa seguir com rapidez e firmeza
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- Atilio A. Boron
- 19/02/2013
A arrasadora vitória de Rafael Correa, com uma porcentagem de votos e uma diferença entre ele e o seu mais próximo concorrente, que teriam desejado Obama, Hollande, Rajoy, entre outros, deixa algumas lições que é conveniente recapitular.
Primeira, a mais óbvia: a ratificação do mandato popular para seguir pelo caminho traçado, mas, como disse Correa em sua coletiva de imprensa, avançando mais rápido e profundamente. Sabe o reeleito presidente que os próximos quatro anos serão cruciais para assegurar a irreversibilidade das reformas que, depois de dez anos de gestão, teriam concluído com a refundação de um Equador melhor, mais justo e mais sustentável. Um Equador onde a diversidade não seja fonte de desigualdade. Na coletiva de imprensa, citou: “ou mudamos agora o país ou não mudamos mais”. O projeto de criar uma ordem social baseada no socialismo do sumak kawsay, o “bem viver” de nosso povo, exige atuar com rapidez e determinação. Mas isto também o sabem a direita conservadora e o imperialismo, e por isto se pode prever que vão redobrar seus esforços para evitar a consolidação do processo da “Revolução Cidadã”.
Segunda lição: se um governo obedece ao mandato popular e produz políticas públicas que beneficiam a grande maioria nacional – que , ao fim e ao cabo, se trata de democracia – , a lealdade do eleitorado pode ser tomada como segura. A manipulação das oligarquias midiáticas, a conspiração das classes dominantes e os estratagemas do imperialismo se chocam contra o muro da fidelidade popular diante de um governo fiel ao seu mandato.
Terceira, e como consequência da anterior, a esmagadora vitória de Correa demonstra que a tese conformista tão comum no pensamento político convencional, a saber: “o poder desgasta”, só é válida na democracia quando o poder se exerce em benefício das minorias ricas, ou quando os processos de transformações sociais perdem peso, titubeiam e eventualmente se detêm. Ao paralisar, ao abandonar o impulso transformador, encaminha-se até a sua própria destruição. Sua condição de viabilidade é o permanente aprofundamento e aceleração do processo reformista. Quando se governa tendo em vista o bem-estar das vítimas do sistema, passa a ocorrer o que decorreu ontem no Equador; se, na eleição presidencial de 2009, Correa venceu no primeiro turno com 51 por cento dos votos, agora o fez com 57 por cento – diante da contagem existente enquanto escrevo esta nota (25 por cento dos votos apurados). Em vez de "desgaste", consolidação e crescimento do poder presidencial.
Quarta e última, com esta eleição se supera a paralisia decisória gerada por uma Assembleia Nacional que se opôs com intransigência a algumas das mais importantes iniciativas propostas por Correa. Embora haja poucos dados disponíveis a respeito, não há dúvidas de que a Aliança PAIS terá a maioria absoluta dos membros da assembleia, com possibilidades de alcançar uma representação parlamentar que permita contar com uma maioria de dois terços qualificados. Uma Assembleia Nacional que acompanhe o processo de mudanças teria que se dedicar de imediato a elaborar e sancionar uma Lei Orgânica de Comunicação, um novo Código Ambiental, a Lei de águas (essencial para a Reforma Agrária), entre outras peças legislativas de fundamental importância. A reconfiguração do mapa sociopolítico da Assembleia Nacional permitirá remover os obstáculos que, até agora, impediram o avanço em algumas frentes estratégicas do processo de construção de uma nova sociedade.
Com a vitória de Correa, a recente vitória de Hugo Chávez na Venezuela e a ratificação esperada do mandato popular de Evo Morales na Bolívia, o núcleo duro do "giro à esquerda" experimentado pela América Latina no início do século é consideravelmente reforçado, exercendo uma influência positiva sobre os processos em curso em países como Argentina, Brasil e Uruguai. Conclusão: os tempos mudaram. A ratificação de um presidente que liderou um processo formidável de mudanças sociais e econômicas, que aposta sem reservas - e trabalha - para a integração latino-americana, que desafiou o império incorporando seu país à ALBA e acabou com a presença dos EUA na base Manta, que realizou uma auditoria da dívida externa exemplar, reduzindo significativamente o seu montante, que concede asilo a Julian Assange e que tirou o Equador do CIADI não é algo que se vê todos os dias. Há uma grande razão para comemorar. Parabéns Rafael Correa, Saúde Equador!
Atilio A. Boron é sociólogo argentino.
Traduzido por Daniela Mouro e Valéria Nader, Correio da Cidadania.
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