Correio da Cidadania

Obama: são dois pra cá, um pra lá

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No começo de seu governo, o presidente Obama afirmou querer os Estados Unidos respeitados por suas ações justas, não temidos por sua força. Nestes seis meses, ele vem procurando realizar tal sonho.

 

Mas não é fácil, a oposição interna, que deseja a continuidade da agressiva política imperial de George Bush, é muito forte. Ele tem contra si grande parte do Congresso (em algumas questões a maioria absoluta), a maioria da mídia (inclusive os pastores-atores de rádio e T), o complexo industrial milita, alguns grandes conglomerados (especialmente a poderosa indústria petrolífera) e os lobbies pró-Israel (destacando-se a AIPAC, com 100 mil membros e um orçamento anual de 65 milhões de dólares).

 

Todo este formidável exército age para manter no país uma opinião pública predominantemente conservadora, a qual só devido ao acachapante fracasso do governo Bush aceitou a mudança encarnada em Obama.

 

Para mudar a política externa americana, é necessário mudar essa opinião pública. Só assim ela levará o Congresso a adotar posições mais justas e fortalecerá o governo para enfrentar a oposição dos grupos de pressão direitistas.

 

Obama está tentando fazer isso. Não com a coragem desejável, é verdade. Vemos que ele alterna excelentes atitudes com saídas "tipo Bush", felizmente em menor número e menos significativas.

 

No plano interno, ele proibiu as torturas, ordenou o fechamento de Guantánamo em um ano e decidiu julgar os acusados de terrorismo por tribunais civis em vez de militares. De outro lado, conforme acaba de declarar o general Jeh C. Johnson, advogado do Pentágono, "a administração Obama pode manter prisioneiros indefinidamente mesmo quando eles tiverem sido julgados e absolvidos".

 

É inegável que os sinais da mudança chegaram à América Latina quando o governo americano votou a favor do cancelamento da suspensão de Cuba pela OEA, aprovou a eleição do governo esquerdista de El Salvador e cortou a ajuda econômica aos golpistas hondurenhos. Mas o cancelamento do câmbio favorecido para exportações bolivianas, que pode causar a perda de 25 mil empregos, foi ação típica dos tempos de George Bush.

 

No Iraque, a saída das tropas em 19 meses foi contrabalançada negativamente com a permanência de 50 mil "militares para treinamento" até fins de 2011.

 

No Irã, depois de Obama estender as mãos para o governo dos aiatolás, propondo negociações em vez das antigas ameaças, fechou-as quando Hillary pregou sanções ainda mais duras para frear o programa nuclear de Teerã. Alega-se ser um lance para consumo do povo americano, indignado com a repressão dos oposicionistas iranianos. E que, em breve, Obama retomará a postura de conciliação. A conferir.

 

Apesar do general nomeado para o Afeganistão ter um passado tenebroso (ligado a torturas e a unidades clandestinas da CIA), ele mandou suspender os bombardeios sempre que ameaçassem civis. Mas os direitos humanos não atravessaram a fronteira com o Paquistão e Bush foi excedido no número de mortes de camponeses inocentes por mísseis lançados de aviões sem piloto.

 

É na Palestina que Obama atuou com mais firmeza. No seu discurso do Cairo, ele defendeu os direitos dos árabes expulsos de suas terras, assunto tabu para os líderes do Ocidente. Mais do que nenhum dos seus antecessores, vem insistindo na tese dos dois Estados. E tem sido enfático ao exigir um imediato ‘stop’ na expansão dos assentamentos. Infelizmente, neste front Obama está dando "um passo pra lá" ao omitir-se na questão de Gaza, submetida a um bloqueio implacável pelo exército israelense, que não permite a entrada de material de construção, o que mantém a cidade em ruínas.

 

Apesar dos inegáveis avanços, a "mudança" prometida por Obama ainda está longe de se completar.

 

No Iraque, é mais fácil: basta que ele retire os exércitos no prazo prometido, inclusive os 50 mil "treinadores".

 

As coisas estão caminhando bem na América Latina. O marco decisivo, ou seja, o fim do bloqueio de Cuba, deverá vir como a última etapa de um processo que se iniciou com o cancelamento da suspensão de Cuba na OEA.

 

O Afeganistão é um caso complicado. Não seria justo simplesmente sair, deixando o país à mercê dos ferozes talibãs e das milícias dos "senhores da guerra" e dos traficantes. Ou continuar no país, apoiando um governo corrupto, herança de George Bush. Bombardear a região fronteiriça do Paquistão pode ser importante para a guerra contra os talibãs, mas é um crime, pois vitimiza a população local.

 

Quanto ao problema da Palestina, Obama parece, com discursos e declarações cada vez mais firmes, querer convencer as opiniões públicas dos Estados Unidos e de Israel a pressionarem o congresso americano e o Estado judeu para aceitarem uma nação árabe independente e viável na Cisjordânia e em Gaza.

 

Difícil de dar certo. Mais eficiente seria Obama usar o poder de pressão do seu país, ameaçando cortar a ajuda de 4 bilhões de dólares anuais ao exército de Israel e apoiar condenações no Conselho de Segurança, que poderiam levar a bloqueios econômicos como os que foram feitos contra a União Sul Africana.

 

Só assim o "dois pra cá, um pra lá" de Obama terminaria, fixando-se somente ao lado da mudança real que os povos do mundo esperam.

 

Luis Eça, Carlos Alberto Cordovano Vieira e José Juliano de Carvalho Filho integram o Grupo de São Paulo, um grupo de pessoas que se revezam na redação e revisão coletiva dos artigos de análise de Contexto Internacional do Boletim Rede, editado pelo Centro Alceu Amoroso Lima para a Liberdade, de Petrópolis, RJ.

 

Contato: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.

 

Artigo publicado na edição de julho de 2009 do Boletim Rede.

 

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