Correio da Cidadania

Transgênicos: deputados atropelam direito à informação

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A irresponsabilidade do arranjo conservador formado no Congresso Nacional parece sem limites, sem nenhuma preocupação com a estabilidade democrática ou com os direitos fundamentais dos cidadãos e cidadãs. Todos os dias somos bombardeados por alguma ação absurda dos nobres parlamentares na defesa dos interesses do poder econômico e em detrimento da maioria da população.

 

A chegada de Eduardo Cunha ao comando da Câmara abriu as porteiras para um passeio de preconceitos e ressentimentos sociais, além de interesses de grupos econômicos, por meio de projetos de lei absurdos, e por uma onda golpista que ultrapassa o ataque ao governo, elegendo os eleitores, de forma indiscriminada, como alvos.

 

A nova obra irresponsável da Câmara foi a aprovação de Projeto de Lei nº 4048/2088, de autoria do deputado Luiz Carlos Heinze (PP/RS), um dos vários membros do Partido Progressista na Operação Lava Jato, e que acaba com a rotulagem dos transgênicos comercializados no mercado, atendendo a pleito antigo de multinacionais, como a norte-americana Monsanto, e aos anseios da bancada ruralista que objetivam impor a sua vontade ao conjunto da sociedade.

 

Tal proposta de lei, além de carecer de constitucionalidade, pois ofende ao princípio da precaução, coloca em risco o meio ambiente, a saúde e o próprio direito de escolha dos consumidores, na medida em que estas não podem mais optar por um produto contaminado por modificações genéticas ou por outro livre deste tipo de contaminação.

 

Produtos transgênicos são aqueles que sofrem modificação do seu código genético pela introdução de material obtido em outra espécie. Diferem, portanto, dos produtos híbridos, que são manipulações genéticas realizadas entre indivíduos da mesma espécie, mas de tipologias diferentes.

 

Como exemplo de produto híbrido, podemos utilizar a velha experiência do pai da genética moderna, Mendel, que misturou ervilhas de casca lisa com as de casca rugosa, obtendo uma nova variedade de ervilha, com características próprias.

 

No caso dos transgênicos, o exemplo clássico é a soja resistente ao agrotóxico “glifosato”, produzido pela multinacional Monsanto sob nome de “Roundup”. A variedade teve o seu código genético misturado com o de uma bactéria que sobrevive à ação química do produto. Como todos sabem, soja e bactérias não são da mesma espécie, portanto, estamos diante da criação de um produto geneticamente diferente e que, neste caso, atende aos interesses comerciais monopolistas da empresa.

 

Estudos realizados em 2001 por equipe de cientistas independentes demonstram que a soja transgênica Roundup Ready (RR, pronta para o Roundup), desenvolvida pela Monsanto, produz proteínas desconhecidas e, desta forma, efeitos também desconhecidos sobre os demais organismos vivos.

 

Além da Monsanto (EUA), apenas mais cinco grupos de multinacionais dominam o mercado de transgênicos no mundo agrícola: a Syngenta (Suíça), Dupont (EUA), Basf (Alemanha), Bayer (Alemanha) e Dow (EUA). Desta forma, o projeto do deputado Heinze (PP/RS), aprovado por 320 deputados, defende o interesse de uma ínfima elite empresarial internacional e coloca em risco tanto a soberania da economia nacional como a nossa soberania ambiental e alimentar.

 

O grande risco do comércio indiscriminado de produtos transgênicos sem rotulagem, na contramão da política adotada no resto do mundo, que privilegiou o princípio da precaução, é o de colocar os consumidores no mercado da incerteza, tendo em vista que não temos o menor conhecimento sobre os riscos e ameaças destes produtos transgênicos à saúde humana, das demais espécies animais, dos vegetais e ao ambiente.

 

Para os ruralistas e para as multinacionais de sementes e de agrotóxicos, ao contrário, há a plena certeza de lucros crescentes, ao custo do comprometimento da vida, do patrimônio ambiental e da nossa soberania alimentar, independentemente do que for descoberto adiante.

 

Enquanto a sociedade se mantiver omissa à onda conservadora e guiada pelos interesses da mídia golpista, o risco do crescimento das ameaças a direitos fundamentais é crescente, e o preço pode ser muito grande, incluindo danos à nossa saúde, ao ambiente, à Democracia e à própria soberania nacional.

 

 

Sandro Ari Andrade de Miranda é advogado e mestre em ciências sociais. Mmantém o blog Sustentabilidade e Democracia.

Publicado originalmente em Outras Palavras.

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