Correio da Cidadania

Primeiro impacto

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Leia a íntegra do discurso histórico de Lula em São | Política

Uma reflexão de momento, sem maior elaboração: num momento em que Bolsonaro, um psicopata genocida, distribui negacionismo, dor, sofrimento e morte, Lula se agiganta novamente. Carisma, perspicácia, empatia para com o sofrimento da imensa maioria de brasileiras e brasileiros. O velho Luiz Inácio sabe fazer o olho de muita gente brilhar (o meu também, não era cisco).

Após a sucessão de ataques à sua dignidade pela grande mídia e pela turba insana, do tucanato à extrema-direita, após uma prisão ilegal e processos vergonhosos jurídica e eticamente, após perder esposa, neto e irmão, a energia de Lula para enfrentar essa onda de maldade visceral contagia. Mas seu discurso deixa completamente nítidos também seus limites, não apenas suas virtudes.

Primeiro, e talvez seja difícil mesmo pensar que ele possa fazer outra fala, Lula fez em vários momentos a própria apologia da conciliação de classes. Lula fala do diálogo com o agro, a FIESP, a Febraban, enfim, com o "mercado"; do diálogo com militares, embora aqui tenha demarcado, muito corretamente, o lugar que as tais FFAA deveriam ocupar se o chamado "Estado de Direito" não fosse sempre aquela fachada para o "Estado de direita"; se o "estado de exceção" não fosse a regra, enfim, se não soubéssemos que o Estado é de classe.

Como bem disse o Acácio Augusto no Twitter, Lula é o verdadeiro "centro" e só num país dominado por uma burguesia herdeira direta das capitanias hereditárias - violenta, ignorante e escravista - para alguém achar que existe "polarização" ou pior, "simetria", em que Lula é um "polo" e o genocida-em-chefe é outro.

Segundo, sua perspectiva continua sendo a da inclusão pelo consumo, da expansão econômica ilimitada, do carro, do petróleo e do carbono. Quem ouve Lula, pensa que o colapso ecológico não existe, a emergência climática não existe. Se isso já seria preocupante em 2002, o que dizer em 2022, com mais de 40 ppm (partes por milhão) de CO2 acumulados? Se essa impossibilidade física de seguir predando a natureza para agradar às maiorias sociais e ao capital simultaneamente - condição material para o sucesso de qualquer "conciliação de classes" - não é captada por Lula, o que esperar?

Feitas estas críticas, quero dizer que precisamos sair da era das trevas de Bolsonaro para seguir lutando. Isso é urgente. Não devemos sequer esperar 2022 para seguir pressionando nesse sentido, até porque isso significa menos gente morta na carnificina pandêmica patrocinada pelo próprio ocupante da presidência.

Mas se, esgotadas essas possibilidades e 2022 for o horizonte, é preciso entender o peso que Lula tem e sua capacidade em mobilizar afeto e esperança, oferecendo pulsão de vida em oposição à necropolítica. Se ausência de crítica e adesismo seriam péssimos, igualmente seriam sectarismo e autoproclamação.

E depois? Da barbárie e da era das trevas voltaríamos, em condições mais difíceis e mais instáveis, à civilização e ao século 20. Mas rapidamente ficaria evidente como o centrismo desenvolvimentista/produtivista seria insuficiente. Algo muito mais avançado precisa estar sendo gestado para substituí-lo. Sob pena de a barbárie retornar, ainda mais violenta e destrutiva.

Alexandre Araujo Costa é cientista do clima.

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