Correio da Cidadania

Belo Monte “praticamente quebrou a resistência dos povos indígenas da região de Altamira”

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A Usina Hidrelétrica de Belo Monte, localizada no Rio Xingu, Pará, na Bacia hidrográfica do Rio Amazonas, inaugurada oficialmente há sete anos e em plena operação há quatro, ainda não cumpriu todas as condicionantes atreladas à possibilidade de construção e funcionamento da obra e segue operando, mesmo com a licença de operação vencida desde 2021.

Segundo Rodolfo Salm, que vive em Altamira desde 2008 e acompanhou o processo de instalação da obra e os impactos socioambientais gerados pelo empreendimento, as condicionantes pendentes dizem respeito à criação do Território Ribeirinho, que visam à realocação de comunidades no entorno da Volta Grande do Xingu; à resolução de projeções técnicas que geraram problemas ecológicos, como a falta de água na Volta Grande, que impede o processo de reprodução dos peixes; e à desintrusão das terras indígenas que estão ocupadas por invasores. Em resumo, diz, Belo Monte continua “um abacaxi político a ser resolvido”.

Na entrevista a seguir, Salm explica os principais problemas socioambientais gerados pela hidrelétrica, menciona as atuais disputas políticas envolvendo grupos da extrema-direita e da esquerda em torno do cumprimento das condicionantes pendentes, e assegura que Belo Monte “quebrou a resistência dos povos indígenas”. “Belo Monte está vencendo essa resistência e ninguém garante que, num próximo governo, seja lavado adiante o plano original de construir uma série de barragens no rio Xingu, que funcionariam como grandes caixas d’água. O problema desse plano é que, ao construir hidrelétricas ao longo do rio Xingu, são causadas perturbações ecológicas que vão gerar imensos desmatamentos e terminarão por diminuir a quantidade de água que passa pelo rio Xingu. No final, não vai ter nem floresta nem rio nem geração de energia”, afirma.

Segundo ele, embora o tema ambiental esteja na pauta do governo federal, hoje, o que está sendo discutido no país é “a conversão, em larga escala, de áreas de pastagem em produção de soja. A turma foi para a China na comitiva do Lula para negociar como vender o Brasil em forma de soja para a China. Ninguém está preocupado com o meio ambiente”, adverte.

Salm também questiona a demora no combate ao garimpo ilegal em terras indígenas, apesar da recente atuação do governo federal nas terras do povo Yanomami. “Tem gente que diz que o governo fez isso [intervenção na área yanomami] estrategicamente; eu acho que foi malandramente. A estratégia foi focar na desintrusão do território yanomami e está todo mundo fingindo que só tem garimpo na terra – não só o governo, mas também a imprensa. Ninguém mais fala do garimpo nas terras dos povos Kaiapó e Munduruku; só se fala no garimpo yanomami, como se não tivesse garimpo em outros lugares. E, hoje, parece que o garimpo na terra dos Yanomami está caindo no esquecimento, sem que a situação fosse resolvida, porque ainda tem garimpo funcionando lá dentro”, critica. E acrescenta: “Não acho que as forças do Estado, aquelas possíveis de serem utilizadas para combater o garimpo, estejam todas concentradas em Roraima. No Pará, vejo a Força Nacional parada. Outra força fundamental é o Exército, que custa uma fortuna ao país e não está fazendo coisa alguma. O Exército precisa desmontar esses garimpos não como empresa, como funcionaram no governo Bolsonaro. Falta firmeza para lidar com a situação”.