Os retrocessos no Semiárido Brasileiro
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- Roberto Malvezzi (Gogó)
- 17/05/2016
Vários retrocessos vieram junto com o governo interino desde o primeiro dia. Um ministério do tempo do Brasil Império – só homens de bens e brancos, sem negros, mulheres e indígenas -, o anúncio do corte na saúde, na educação, encolhimento do SUS, desvinculação do salário dos aposentados em relação ao salário mínimo, eliminação do Ministério da Cultura, daí pra frente.
Dentre esses retrocessos, os que mais impactam o Semiárido são o da Educação, Saúde e a desvinculação do salário mínimo, do qual dependem aproximadamente 100 milhões de brasileiros.
Porém, há retrocessos que o Brasil em geral não vê, a não ser nós que moramos por aqui, na busca de vida melhor para a população nordestina, que sempre esteve à margem dos avanços brasileiros.
O paradigma da “convivência com o Semiárido”, ganhou carne com os programas “Um Milhão de Cisternas” (P1MC) e o Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2), da ASA. O primeiro visando a captação da água de chuva para beber e o segundo para produzir.
Em aproximadamente 15 anos, 1 milhão de famílias receberam a cisterna para beber e cerca de 160 mil famílias uma segunda tecnologia para produzir. É lindo, até emocionante, quando em plena seca vemos espaços tomados de verde com hortaliças ao redor de uma cisterna de produção. Essas tecnologias ainda teriam que ser replicadas ao milhões para garantir a água para beber e produzir, ofertada gratuitamente pelo ciclo das chuvas.
Junto com esses programas veio a expansão da infraestrutura social da energia, adutoras simples, telefonia, internet, melhoria nas habitações rurais, estradas etc.
A valorização do salário mínimo e o Bolsa Família injetaram dinheiro vivo nos pequenos municípios, movimentando o comércio local, o maior beneficiário desses programas.
Houve também contradições profundas, como a opção pela megaobra da Transposição de Águas do São Francisco, ao contrário de adutoras simples, e a implantação das cisternas de plástico por Dilma no seu último governo. Além do mais, ela estava encerrando o programa de cisternas para beber, alegando que já tinha atingido o número de famílias necessitadas.
Detalhe: o ministro para o qual liberou as cisternas de plástico orientou o filho para votar contra ela na Câmara dos Deputado. Agora, ele é ministro das Minas e Energia.
Mas esse avanço pressupôs a organização da sociedade civil articulada na ASA e a chegada ao poder de governos estaduais menos coronelísticos e corruptos.
Sobretudo, supôs o apoio do governo federal a esses programas da sociedade civil.
Acabou. Se perguntarem ao atual presidente onde fica o Semiárido Brasileiro, é provável que ele diga que fica no Marrocos. Como não tem base na região, vai entrar pelas mãos dos velhos coronéis ou de seus descentes.
Não é possível destruir a infraestrutura construída. Ela tornou o Semiárido melhor, sem fome, sem sede, sem migrações, sem mortalidade infantil. Mas há muito ainda a ser construído para não haver mais retorno ao ponto da miséria.
Uma delas é a geração de energia solar de forma descentralizada, a partir das casas. Dilma não quis dar esse passo.
Os velhos problemas poderão voltar? No que depender das políticas públicas federais, sem dúvida nenhuma. Quem está no poder não enxerga o Semiárido.
Tempos estranhos, quando setores da sociedade brasileira preferem retroceder aos tempos da miséria total e parte da população se alegra com esses retrocessos.
Roberto Malvezzi (Gogó) possui formação em Filosofia, Teologia e Estudos Sociais. Atua na Equipe CPP/CPT do São Francisco.