Protesto de D. Luiz Cappio ‘não acabará bem’, diz Gogó
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- Mateus Alves
- 03/12/2007
Pala falar da importância da retomada da greve de fome do bispo Luiz Flávio Cappio para a luta contra a transposição do rio São Francisco, o Correio da Cidadania entrevista Roberto Malvezzi, o Gogó, coordenador da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e um dos principais opositores do projeto do governo federal.
Para Gogó, o protesto de Dom Luiz, iniciado na cidade de Sobradinho (BA), alerta para a incapacidade das obras em atender as vítimas da estiagem no Nordeste e enfrenta forte oposição do governo federal, que busca isolar o bispo da mídia, dos representantes políticos e da Igreja.
Correio da Cidadania: Quais são os motivos que levaram Dom Luiz Cappio a reiniciar uma greve de fome? O protesto similar realizado pelo bispo em Cabrobó (PE), há dois anos, surtiu efeito?
Roberto Malvezzi: Objetivamente, o governo iria abrir um canal de diálogo a respeito de alternativas para a transposição do rio São Francisco, tendo firmado um compromisso quando Dom Luiz encerrou sua primeira greve de fome.
Isso, nunca fez. Após dois anos, ficou claro que o governo não quer dialogar sobre alternativas; aceitam falar algo sobre a obra em si, mas não sobre alternativas para a transposição.
A situação se agravou recentemente com o fato de o rio estar muito baixo – quase 600 km de rio viraram esgoto; em Sobradinho, cidade onde Dom Luiz se encontra, o rio está apenas com 14% de seu volume normal.
A estiagem está afetando nove estados do Nordeste, e o governo se recusa a considerar qualquer alternativa. Ora, se dizem que 12 milhões de pessoas serão beneficiadas pela transposição, 34 milhões de pessoas no meio urbano e mais 10 milhões no meio rural seriam beneficiadas pela implementação do Atlas do Nordeste e por meio da construção de cisternas. São 44 milhões de pessoas beneficiadas, com serviços reais de abastecimento de água, pela metade do valor que está sendo investido na transposição.
Diante desse impasse, Dom Luiz sentiu que o governo queria enganá-lo, e sua alternativa foi retomar a greve de fome.
CC: Qual a importância dessa retomada da greve de fome na luta contra a transposição?
RM: Com isso, Dom Luiz está dizendo, radicalmente, “ou suspendem a transposição, arquivam o projeto e retiram o Exército dos canteiros de obras ou vou até o fim”.
CC: O bispo está realmente convicto de ir até o fim?
RM: Sim, está. Ficamos sabendo que o governo está com estratégia em três níveis para isolá-lo, minimizando a sua decisão.
Primeiro, procuram isolá-lo da grande mídia, para que a greve de fome não repercuta; isolá-lo da classe política do Nordeste, de deputados e senadores; e isolá-lo da Igreja. E o governo está tendo certo sucesso nas duas primeiras esferas, mas ainda temos dúvidas se terá sucesso entre a Igreja.
CC: E por que meios o governo está fazendo isso?
RM: A notícia não está circulando na grande mídia, somente em veículos locais e regionais. A Globo, por exemplo, sequer tocou no assunto. Deputados e senadores também não deram as caras ainda, especialmente aqueles ligados ao PT. Da outra vez que Dom Luiz havia iniciado uma greve de fome, estes estavam presentes.
CC: Você acredita em alguma possibilidade de diálogo entre Dom Luiz e o governo?
RM: Não haverá diálogo. O governo nunca quis dialogar, e agora está mais fechado ainda. Eu acredito que isso não irá acabar bem.
CC: De que maneira os movimentos sociais estão apoiando a greve de fome do bispo?
RM: Os movimentos estão reunidos no apoio. Haverá uma grande manifestação, em nível nacional, no próximo dia 10; a Via Campesina irá promover ações em todo o Brasil.
Até lá, tomarão lugar diversas ações pontuais – e há também manifestações oriundas de indivíduos e grupos sociais, como redes de jejum, de solidariedade e celebrações.
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Comentários
Mas, deixar-se morrer por uma causa coletiva, estando em gozo de plena liberdade, não me parece justo nem necessário.
Por que não lutar pela causa, insistindo em mobilizar a maioria pela palavra e pela ação? Dom Cappio precisa meditar sobre que interpretações dariam (toda a sociedade nos seus mais diversos estratos) ao seu gesto, supondo que morresse de fome. Que contibuição pela claridade, pela desmistificação, pela politização dos cidadãos poder-se-ia esperar de um desenlace mortal?
E não seria atribuir-se um poder, uma importância, algo messiânica, longe das sandálias da humildade que devemos todos calçar de vez em quando?
Prefiro D. Cappio vivo e lutando — ainda que contra o impossível — que morto e ungido como santo a consolar-nos de nossas desventuras.
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