Combate ao tráfico de drogas e o genocídio da juventude negra
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- Roberto Malvezzi (Gogó)
- 21/11/2016
Se há um consenso na política de combate ao tráfico de drogas é sobre ela ter alto custo e ser absolutamente inócua. Longas matérias conversando com gente do BOPE, especialistas no assunto e mesmo pessoas ligadas ao tráfico têm esse ponto em comum.
Entretanto, dos 30 mil jovens mortos por homicídio a cada ano no Brasil, 77% são negros (https://anistia.org.br/campanhas/jovemnegrovivo/).
Ao celebrarmos o dia da Consciência Negra, os jornais avisam que 7 jovens foram eliminados nas matas da Cidade de Deus, após a queda de um helicóptero da polícia. Pouco depois, a própria mídia dizia que um laudo preliminar constatara que nenhuma bala atingira o helicóptero ou algum policial morto no acidente.
Entretanto, quando a polícia pegou um helicóptero com 500 kg de cocaína em Minas, registrado em nome de senador, ninguém soube dizer até hoje de quem era o helicóptero e muito menos a cocaína.
A atriz Cléo Pires afirmou claramente nos jornais esses dias que usa droga de modo recreativo. Sabe-se que em certas festas das elites, em ambientes fechados, a droga faz parte do bufê. Para que haja esses consumidores é preciso que alguém seja o fornecedor.
Então, se um dia a guerra inútil contra Al Capone liberou o álcool, se o tabaco também é droga liberada, é de se perguntar por que persiste esse modo de combater o tráfico das drogas ilícitas, matando jovens negros e a droga circulando livremente nos ambientes mais sofisticados.
O único político que se propôs discutir essa política abertamente foi Fernando Henrique. Em que pese todas as divergências com ele em outros assuntos, nesse ele tem razão.
As Igrejas preferem tratar dos drogados, mas não discutir a prevenção real contra a droga. Tudo bem, é um gesto humanitário e as famílias que têm algum tipo de dependente químico em casa sabem o desastre que isso significa para o ambiente familiar. Mas não basta.
Enfim, se é inútil, por que não discutir claramente a política de combate ao tráfico? Se não fosse crime, ao menos a polícia não teria mais pretexto para entrar nas favelas e matar os jovens, policiais também não seriam mortos nessa guerra, os presídios se esvaziariam e quem sabe pudéssemos fazer uma reflexão social mais profunda e eficaz da prevenção, assim como em relação ao álcool e ao tabaco.
Ou, podemos concluir, tal política serve para fins higienistas, ou seja, para saciar a sede de sangue que certas partes de nossa sociedade têm, alimentando a tese que bandido bom é bandido morto, desde que seja pobre, negro e da favela.
Roberto Malvezzi atua na Comissão Pastoral da Terra na região do rio São Francisco.