Correio da Cidadania

A prisão do cachorro morto

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Temer é carta fora do baralho e sua prisão nada representa para o sistema político exceto a confirmação de que a República apodrece diante dos olhos do sujeito simples. Este tem seu breve gozo ao saber que finalmente os "corruptos estão pagando" por seus crimes. A política burguesa criou a Lava Jato e continuará sua tarefa de reduzir a política à moral como ideologia eficaz no mar da despolitização.

A esquerda revela sua impotência diante da ofensiva burguesa e do governo proto-fascista de Bolsonaro. Apegada às ilusões do liberalismo de esquerda, afirmando sua fé republicana, a esquerda vacila em questões fundamentais porque não quer praticar um novo radicalismo político que a crise do sistema está exigindo. A esquerda segue aferrada ao bom-mocismo e, ao recusar o radicalismo, entrega este valioso terreno à direita.

O PT - um partido da ordem - em nota oficial defende o "devido processo legal" para Temer como expressão de impotência diante da prisão de Lula e também como defesa da justiça burguesa.

Há quem no PSOL afirme que Temer já deveria estar preso porque é um bandido, mas vai a Curitiba gritar "bom dia presidente Lula" exatamente quando milhões são convencidos de que agora, finalmente, "ninguém está acima da lei".

É preciso captar o essencial: as regras do jogo que liberais de esquerda tanto prezam estão agora a serviço da classe dominante como nunca antes. A luta na legalidade burguesa não representa terreno fácil, ao contrário do que supõe o cretinismo parlamentar.

Uma geração de políticos burgueses está sendo incinerada. A nova geração sorri de maneira discreta e não vacila em ocupar as cadeiras vagas. Ontem foi a vez de um cachorro morto. Amanhã poderá ser um senador tucano de olhar taciturno... Pouco importa.

A República derrete. O ultraliberalismo avança a passos largos. As vítimas do sistema não reconhecem no discurso e na prática da esquerda dominante a representação de seus interesses.

A direita avança. A crise se aprofunda de maneira acelerada.

As ilusões do liberalismo de esquerda dominam a cena e, não poucas vezes, insinua-se como solidez num momento em que "tudo que é sólido se desmancha no ar".

Leia também:

“O governo Bolsonaro trará mais violência e desigualdade, mas a esquerda liberal não tem respostas à altura” - entrevista com Nildo Ouriques

Nildo Ouriques é economista e presidente do Instituto de Estudos Latino-Americanos da UFSC.

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