Correio da Cidadania

Brasil: afirmar a democracia, não o autoritarismo

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Foto: Oam Santos/Fotos Públicas

O país encontra-se às vésperas da eleição geral de outubro imerso em crise política e econômica, haja vista a combinação de tosquedade e de menosprezo do governo atual com a sociedade por causa de problemas como inflação ascendente, desemprego em torno de dez cento – mais de onze milhões de pessoas -, insegurança pública, indiligência com ciência e tecnologia (C&T), displicência com o meio ambiente, recrudescimento da pandemia do vírus corona – quase quatrocentos mil casos assinalados na última semana - entre outros pontos.

Não seria o cenário aguardado para celebrar duzentos anos de emergência do Brasil como nação formalmente soberana e integrada assim de maneira voluntária ao sistema internacional a datar de então, ainda que em constante posição secundária em decorrência de escolhas inadequadas para o desenvolvimento, malgrado o potencial.

Há dois séculos, o quadro em prol da autonomia havia sido estimulado pela pressão externa, no caso portuguesa, em função do desejo de Lisboa de recuperar do Rio de Janeiro a primazia na administração do decadente império. Oficiais lusos, insatisfeitos com o comando do país de fato com pares britânicos, rebelaram-se em 1817.

Apesar da repressão diuturna local e da ausência de apoio real da nobreza lusitana, refestelada no lado sul do Atlântico, os militares teriam êxito em 1820 a partir do Porto. Com o sucesso do movimento, haveria a aspiração de regredir o status administrativo do Brasil, com o propósito de fortalecer Portugal.

A consequência da indevida pretensão ultramar contribuiria para desaguar no setembro de 1822, posto que o regime monárquico perdurasse em solo pátrio e pasmem com representante da mesma dinastia da antiga metrópole – casa de Bragança.

Com obtenção da soberania, mantém-se de todo modo a supervisão econômica europeia: antes, lisboeta; depois, londrina, embora também ecoasse a ambição washingtoniana, materializada no ano seguinte sob o nome de Doutrina Monroe.

Em síntese, a América para os americanos, aplicada na prática às imediações daquele país pela atuação diplomática, despreocupada de balizas democráticas, e navais, encarregada de assegurar a estabilidade e, destarte, os interesses do setor exportador.

No registro do primeiro centenário brasileiro, a presença comercial e financeira britânica continuou, a despeito de a ascensão norte-americana ser inexorável – atribui-se ao presidente Calvin Coolidge, de agremiação republicana, no início do segundo mandato (1925) a perspectiva de que o negócio dos Estados Unidos seriam os negócios!

Nos dias correntes, a influência norte-americana sobre populações sul-americanas persiste, não obstante a crescente irradiação econômica chinesa sobre o continente, em especial sobre os países mercosulinos.

Em 1822, a sociedade local identificava-se, mesmo de forma contida, com valores da Grã-Bretanha – monarquia constitucional e liberal, em tese; em 1922, com os dos Estados Unidos – república democrática, em princípio; em 2022, não há isso com uma nação específica, conquanto se equilibre ela de modo delgado entre democratismo e autoritarismo. Que prevaleça nas urnas em outubro vindouro a consciente rejeição à tentação do cesarismo.  

 

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Virgílio Arraes

Doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília e professor colaborador do Instituto de Relações Internacionais da mesma instituição.

Virgílio Arraes
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