A Reconstrução da Esquerda
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- Antonio Julio de Menezes Neto
- 10/04/2008
De um lado, a elite econômica composta por banqueiros, grandes comerciantes e grandes empresários lado a lado com a elite política representante da direita clássica ou do novo "centro" político. Este último, o centro, assumiu recentemente uma "social-democracia tardia", ou a "terceira via", configurando-se como liberal-sociais.
Os primeiros, da direita clássica, podem ser representados, partidariamente, pelo DEM, PP, PTB e parte do PSDB, PMDB e PDT e os segundos, de centro, pelo PT, PC do B e parte dos mesmos PSDB, PMDB e PDT. Estas elites diversas não realizam, hoje, nenhuma crítica ao capitalismo e estão plenamente acomodadas ao sistema, discutindo apenas quem "fez mais ou menos quando foi ou é governo", ou se o país está virando uma potência capitalista no contexto mundial.
Mas qual seria o "outro lado"? Depois de tantos anos neoliberais, de tantos partidos, movimentos e sindicatos caminharem para o lado conservador e esquecer as críticas ao capitalismo, ainda existiria um "outro lado" na sociedade brasileira? Ainda existiria um lado que quer transformar mais profundamente a sociedade e para isto se disporia a enfrentar o poder e as elites, como o antigo PT fazia? Certamente que sim, pois os sonhos e as necessidades reais de uma sociedade mais justa são completamente inseparáveis do ser humano.
Nunca, em tempo algum, o conformismo social foi totalizante. Sempre pessoas e grupos se rebelaram - mesmo que de forma minoritária - e são justamente estes grupos e pessoas, muitas vezes criticados no seu tempo, que pavimentam novos caminhos, novos sonhos e novas realidades. Assim, estamos vendo no Brasil atual um movimento, ainda pequeno e subterrâneo, e em certo ponto ainda vacilante perante o governo Lula, de novos atores entrando em cena.
São os movimentos sociais, sindicais, estudantis e políticos que, longe do poder, começam a debater e colocar em prática suas idéias e sonhos. Sonhos de reforma agrária, de educação para todos, de habitação, saneamento, trabalho justo, saúde, lazer e arte, dentre outros, como bens comuns. Lutam pelo socialismo e não têm medo de criticar o capitalismo. As ocupações estão sendo uma das principais marcas destas novas lutas, visíveis nas ocupações de terras e nas ocupações de diversos campus universitários. E cresce a esperança de que estes novos movimentos não sejam apenas atores sociais, mas sim autores de nossa própria história.
Temos outros exemplos. Estamos vendo os movimentos sociais, sindicais e estudantis se manifestarem na "Campanha Nacional pela Anulação do Leilão da Vale do Rio Doce". Esta campanha realiza manifestações e promoveu um plebiscito popular em setembro para saber se o povo brasileiro desejava anular a privatização, conseguindo trazer esta discussão à cena política.
Mas o eixo principal que delimita os projetos políticos no Brasil atual é a transposição do Rio São Francisco. Este projeto demarca claramente a posição capitalista do governo na defesa do agronegócio e das grandes obras, vendo nestas a possibilidade do "progresso brasileiro".
Ao mesmo tempo, pela esquerda, está se criando uma resistência e uma nova visão de sociedade, não mais baseada na defesa do "aumento do consumo interno" sem planejamento social ou de "produzir mais para exportar". A nova esquerda começa a discutir, por exemplo, uma reforma agrária no semi-árido que coloque o ser humano no centro das políticas e ofereça a possibilidade de uma vida simples e digna para os habitantes destas áreas.
Assim, tão importante quanto discutir a transposição em si, está colocada neste momento histórico para a esquerda a possibilidade de discutir novos referenciais políticos não-capitalistas, ou seja, novos referenciais para uma nova esquerda. Esta esquerda não deve mirar na produção e no consumo capitalista e nem querer concorrer com esta. Deve sim discutir e debater, de forma planejada socialmente, as necessidades humanas, sejam as básicas ou as novas que transcendam o mundo da necessidade e encaminhem para o mundo da liberdade humana.
Desta forma, vemos que, mesmo de forma tímida, os movimentos populares não estão totalmente paralisados pelas ações do governo, da oposição conservadora e nem das elites, e que temos uma oportunidade histórica de reconstruirmos, em novas bases, a esquerda.
Antonio Julio de Menezes Neto é sociólogo, doutor em Educação e professor na FAE/UFMG.
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Comentários
A gente poderia ir dando sugestões e o Correio da Cidadania coletando, discutindo e repassando.
Lá vai a minha: a esquerda deve lutar pelo reconhecimento das rádios comunitárias.
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