Correio da Cidadania

O Índio e o Engenheiro

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A questão indígena e negra atua no tecido social brasileiro como um câncer crônico, que não mata, mas tortura e inferniza a vida do paciente de forma definitiva. É como o fígado de Prometeu, consumido por um abutre perpetuamente, mas que se recompunha quando a tortura parecia chegar ao final.

 

O Brasil não consegue superar essas questões porque elas são elementos fundantes e constituintes da civilização brasileira. Matar índio e lhes roubar o território, explorar e matar negro, destruir a natureza são elementos constitutivos da civilização brasileira.

 

São realidades do presente, não apenas do passado. O Conselho Missionário Indigenista nos diz que no ano passado 92 lideranças indígenas foram assassinadas. O conflito de Raposa Serra do Sol e o "simbólico" ataque ao engenheiro revelam que não conseguimos - definitivamente não conseguimos - superar esse pecado original da nação brasileira.

 

O Brasil, em determinado momento de sua história, optou por criar os territórios indígenas. Muitos criticam esse sistema, mas foi ele que ao menos preservou algumas regiões ainda com natureza original e exuberante, rica em biodiversidade, além de preservar a vida e a sócio-diversidade indígena, nas suas variadas matizes. Acontece que esses territórios guardam as riquezas que ainda não foram exploradas, não foram saqueadas. Por isso, territórios indígenas e quilombolas tornaram-se "empecilhos ao desenvolvimento".

 

Desenvolvimento de quem? De quê? Dessas aves de rapina que começaram devorando o pau brasil no litoral brasileiro e que não vão sossegar enquanto não derrubarem a última árvore amazônica? Hoje querem mudar a lei para derrubar 50%. Depois vão mudar para derrubar mais 30%. Em última análise, querem destruir tudo, porque não sabem fazer, não sabem ser, a não ser destruindo. Como dizia o homem do agronegócio ao agente da CPT, "quero entrar nessa floresta como um cupim, começando pela primeira árvore do lado de cá, até sair na última do lado de lá".

 

O problema do Xingu agora é a hidroelétrica. Agora, mas daqui a pouco pode ser uma reserva mineral, a água, a biodiversidade. Esses índios vivem sob ameaça há décadas, há séculos. O governo Lula se encarregou em tornar realidade todos os temores que havia no São Francisco, no Madeira, no Xingu e onde mais tiver obras necessárias ao capital. Até nós, que não somos parte das populações tradicionais, mas estamos a seu serviço, nos sentimos mais oprimidos nesse governo do que nos tempos dos outros presidentes pós-regime militar. Nem mesmo as compensações sociais do governo Lula anulam a angústia que se abate sobre as populações agredidas por essas grandes obras.

 

O sacrificialismo inerente ao capital também tornou-se constitutivo desse governo. Por isso, é possível imaginar e entender a reação dos Kayapós ao engenheiro.

 

Vamos ressaltar a dignidade do engenheiro na entrevista que deu à TV. Em nenhum momento fez qualquer referência desairosa aos índios. A jornalista e o meio de comunicação para o qual ela trabalha, esses sim, estavam sedentos de condenação.

 

Talvez o engenheiro tenha a consciência de que a agressão que ele sofreu dos índios seja insignificante diante da agressão que as corporações técnicas a serviço do capital fizeram aos índios ao longo de nossa história.

 

Roberto Malvezzi (Gogó) é coordenador da CPT.

 

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Comentários   

0 #5 Rafaela Alves 02-06-2008 08:59
ô agressão ao engenheiro..se o índio quissese teria matado o engenheiro nakela hora...mas não só fez aquilo pra assustar e pra dizer que vão fazer guerra...mesmo se perderem...vcs já pararam pra pensar quantos sangues já foram derramados de índios?agora só pq esse engenheiro perdeu uma coisa mínima de sangue tá fazendo tudo isso...e ainda falou que a terra é dele..a terra é do índio...a mãe do índio é a terra...ninguém preserva mais a amazônia do que o próprio índio.
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0 #4 visão humanoRicardo Javaé 28-05-2008 13:01
até que fim, alguém com visão imparcial. Parabéns.
quantas cenas horríveis a mídia tem demostrados e a sociedade nem se assusta, agora,quando a questão é indígena, todos condenam, isso é preconceito, até mesmo porque, a mídia nem se quer investiga a questão indígena direito, como por exemplo,por que fizeram isso?
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0 #3 LuizFelipe do Crmo 27-05-2008 16:29
É isso aí.
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0 #2 IroniaTarcísio Vanderlinde 27-05-2008 16:28
Complexo de Belo Monte, eis a questão. Antônio Conselheiro com camponeses "fanáticos" defendeu bravamente outro Belo Monte. Resultado final do avanço do progresso representado pela República e pelo exército:holocausto. As coisas são de fato irônicas e nos fazem refletir.
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0 #1 Cultuar o PrimitivoCarina Tineu 27-05-2008 16:28
Pois é... é muito bonito ver na televisão a agressão do engenheiro, isto só faz as crianças que assistem televisão, perceberem que é bem verdade aquela histórinha que índio come branco.

MENTALIDADE PRIMITIVA: o branco entra na florestinha do índio para explorar e eles comem-no.

Parabéns Brasil!
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