O voto nulo
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- Antonio Julio de Menezes Neto
- 03/11/2008
Apesar da política não ser monopólio dos partidos - como os conservadores tentam nos fazer crer e, desta maneira, excluir os movimentos sociais e os trabalhadores como agentes políticos - é inegável que a disputa política confere um peso muito grande aos partidos e à disputa pelo poder do Estado através da representatividade partidária. E não podemos esquecer que o Estado, desde o século passado, adquiriu uma centralidade muito grande nas disputas pelos projetos políticos. O capitalismo keynesiano e social-democrata contou com forte participação do Estado. Os "socialismos reais" foram, todos, tentativas de construir uma nova sociedade via estatização dos meios de produção e comercialização. Tivemos também as experiências nazistas e fascistas, que também tinham Estados totalitários.
Assim, a modernidade fortaleceu o Estado e centrou-se na disputa pelo poder deste, sendo que nas democracias formais e burguesas o cidadão é chamado para eleger seus representantes através do voto. Esta forma de representatividade toma formatos diferentes em diversos países e no caso brasileiro escolhemos nossos representantes através do voto, contado primeiro para o partido (apesar do desconhecimento deste fato pela maioria dos eleitores, acredito). E, dentre os candidatos do partido, podemos escolher um candidato específico que nos represente e que tenha idéias minimamente próximas às nossas. Caso os nossos candidatos e partidos não sejam eleitos, acatamos, sem necessidade de capitular ou aderir, o resultado das urnas e o eleito passa a representar toda a cidade, o estado ou o país.
Porém, o que acontece quando nenhum dos partidos, coligações ou candidatos comungam minimamente com nossas idéias? Coerentemente devemos exercer livremente o direito de anular o voto, ou seja, de dizer que nenhum daqueles candidatos serve para ser meu representante, de minha cidade, do meu estado ou do meu país. Isto não quer dizer, necessariamente, negação do processo, pois o eleito assumirá a responsabilidade da gestão e, poderemos, livremente, fazer-lhe oposição ou aceitar a sua gestão.
No entanto, temos de reconhecer que o voto nulo é parte do processo instituído e é um direito do cidadão dizer não aos candidatos ou ao processo eleitoral formal. Eu, pessoalmente, fiz esta opção de voto em Belo Horizonte no segundo turno, já que os dois candidatos representavam, na minha avaliação, interesses conservadores e de direita, indo contra as minhas idéias e princípios políticos.
Sei que a discussão do voto nulo comporta interpretações políticas diversas. Existem os que analisam que o voto nulo é a posição coerente com o caos político e eleitoral em que a esquerda brasileira está submetida. Ou seja, seria um momento de negação de todos os processos eleitorais. E existe outra opção, que defende que o processo não deve ser negado e o voto nulo deve ser um instrumento usado apenas na falta de opção. Fico com esta.
Mas como a falta de opções para a esquerda socialista está se tornando rotina nos segundos turnos eleitorais, devemos fazer uma séria análise e buscar construir instrumentos e partidos mais eficazes e unitários na luta para que consigamos ultrapassar a sociedade regida pelo capital e pela mercadoria. Pois, de outro modo, teremos de seguir o caminho constante da anulação de votos no segundo turno.
Antonio Julio de Menezes Neto, sociólogo e professor, é doutor em Educação.
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Comentários
boa a reflexão sobre o exercício do voto na perspectiva da anulação do "direito de escolha".
Um abraço, Paulo
Dei uma olhada rápida no seu texto,
Acho eu com o pouco conhecimento que tenho teoricamente, o texto tem a sua posição enquanto intelectual orgânico. Claro que é polêmico, porém na sociedade em que vivemos hoje sem possibilidade de uma democracia popular, e quando se trata da cidadania e do voto na qual o estado propõem essa forma, já é algo praticamente impositivo, não dialogável e sem direito de exercer a cidadania segundo os pensadores progressistas.
A historia da humanidade é formada por imposição do poder de dominação e também de luta. Mais quanto pensamos na formação e politização dos processos editoriais, que se dá de tal forma que tende a alienar a sociedade e não se discute na sua essência o problema real do nosso país, o que fazer?. Não votar é uma foram de protesto, mais como elevar a consciência da sociedade que vota e que elege e continua elegendo o poder de dominação que tem gerado cada mais vez mais, a fome, injustiça, desigualdade e tantas outras coisas?
Não sei, posso estar fora totalmente do pensamento que vc coloca e que busca historicamente fazer uma ponte com a realidade atual, mais mesmo os partidos que dizem ser de "esquerda" esta enfraquecido e não tem um projeto de formação para a classe no aspecto de politizar a ação e fazer a disputa com dignidade, a não ser ganhar as eleições. Não estou aqui querendo igualar os que dizem ser de "esquerda" com a direita reacionária, o que quero colocar é que tem algo mais a ser feito pelos movimentos sociais, intelectuais orgânicos e aqueles que ainda podemos chamar de progressista. Não sei o que achas? É uma tarefa para pensar...
São também reflexões do processo e falar de texto do professor enquanto educanda do curso de licenciatura em educação do Campo, área de ciência sociais e humanidade é muito difícil, mais achei interessante fazer essa colocações para que possamos ir pensando, nós dos movimentos sociais e claro que a minha posição é votar, apesar de não ter votado nessa eleição. Penso que diante da realidade, temos que eleger o menos pior, já que não temos outra possibilidade. Há não ser que façamos à virada e saímos do campo do agronegocio, da pós-modernidade, dos biocobustivéis e enfrentamos a através da práxis da luta, organizando a sociedade, conscientizando nos formando e dando formação, nos colocando a disposição dessa luta. Ao contrario, não vejo muito ânimo, o que temos hoje são deferentes correntes de pensamento que defende conceitos e concepção e pouca prática na transformação social. Camarada Antonio Julio, penso que temos muito que discutir nas aulas de sociologia o quer fazer???
Grande abraço fraterno,
Marcinha
E outra, o voto nulo também é encarado por algumas pessoas como uma manifestação contra o sistema em geral, contra o próprio estado(caso dos anarquistas), contra a democracia(sim, nem todo mundo acha linda), contra a lógica eleitoral....
Sou partidária do voto nulo e da ação direta, e vejo-o como um direito de manifestação sim. Se nenhum candidato me representa, se o sistema eleitoral não me representa, se eu não concordo com o sistema posto, não concordo com democracia, tenho sim que ter o direito de anular meu voto.
É muito fácil usar expressões tipo "negação do processo", "bagunça generalizada" ou, "são todos ladrões" e esquecer que se existe bagunça e se existem ladrões na política, é porque nós, Cidadãos (lembra?: Democracia é o governo do povo, pelo povo, para o povo) lá os colocamos.
Procure um Partido, inscreva-se, participe. Seja Cidadão!
Tirar o corpo fora não é a solução, é só a entrega oficializada dos seus direitos à turma dos aproveitadores.
Eles adoram o pessoal que anula o voto. A turma deles não anula e é porisso que eles estão sempre em maioria.
No dia em que pararmos de só reclamar e começarmos a agir todos como Cidadãos, este país melhora.
Caso contrário,vai continuar sendo só um paíszinho com cidadãos (com c minúsculo) que adoram desabafar e aliviar o peito, reclamando, reclamando e se indignando, indignando, sem fazer nada de realmente proveitoso politicamente.
Sinceramente, Mª Lúcia Costa, cantora e compositora baiana de Itabuna.
O ideal, no meu ponto de vista, seria o voto facultativo. Quase um sonho por esta banda...
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