Ditabranda e ditadura
- Detalhes
- Gilvan Rocha
- 14/04/2009
O Golpe de Estado de 1964, no Brasil, apesar de ter sido o episódio histórico talvez de maior importância na nossa história recente, nunca foi discutido da forma devida. Pouco se escreveu e esse pouco tem se revelado de péssima qualidade ou plenamente insuficiente, na medida em que se atém à seqüência de fatos, sem, contudo, analisar a natureza do golpe.
Ora, o Golpe de 1964 teve dois momentos. No primeiro instante ele ficou nos limites do bonapartismo, ou seja, foi uma medida de força em nome de todas as facções da burguesia para afastar o perigo de uma insurreição popular, visto que a crescente radicalização das massas trabalhadoras começava a fugir do controle das direções nacionais reformistas, representadas especialmente pelo PCB e PTB, e o exemplo de Cuba, onde um movimento de caráter nacionalista e reformista, sob a bandeira do "pátria ou morte venceremos", por força das massas trabalhadoras, transformou-se numa revolução anticapitalista. O que não era do propósito dos seus românticos dirigentes.
O primeiro momento do golpe tinha aos olhos da burguesia um caráter cirúrgico e logo se voltaria para a ordem democrática burguesa, ou seja, para o festejado Estado de direito. Esse era o acordo entre as partes. Mas, com a retomada do movimento de massas, fossem os estudantes e suas passeatas, fossem os metalúrgicos de Osasco e Contagem, fossem as greves dos bancários em Porto Alegre, Guanabara e Fortaleza, causou-se medo às classes dominantes e a extrema direita se aproveitou do momento para perpetrar um golpe dentro do golpe com o Ato Institucional número 5, em 1968. Assim, tivemos uma "ditabranda" na primeira fase, onde os casos de tortura se circunscreveram ao Recife e à Guanabara; e a partir de 1968 tivemos uma ditaduríssima, particularmente no governo do senhor Garrastazu Médici, de triste memória.
Ao invés de nos escandalizarmos com os rótulos, ditadura e ditabranda, convinha nos escandalizar com o fato de "esquerda" e direita, num pacto silencioso, buscarem pôr uma pedra sobre esse episódio que, se elucidado, muito poderia auxiliar em nossa caminhada.
Gilvan Rocha é presidente do Centro de Atividades e Estudos Políticos - CAEP.
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Comentários
Quero logicamente ver também agentes do estado repressor, que excederam-se em suas ações e eliminaram sem chance de defesa cidadãos brasileiros que lutavam por suas posições ideológicas e que não pegaram em armas.
Quero a anistia isenta, que se esclareçam todos os fatos e verificar se a sociedade até agora enganada pela propaganda distorcida, irá manter sua opinião em favor daqueles que pegaram em armas e felizmente perderam a guerra.
Foi uma pena o STF não ter revogado a lei de anistia. Seria a chance que a sociedade teria de esclarecer os atos terroristas da cúpula que hoje domina os corredores do Planalto central. O que fizeram com o jovem Mario Kozel Filho em 1968 ao entregar para sua mãe uma massa orgânica de pouco mais de um quilo, aos 18 anos de idade, depois da bomba que explodiu num quartel. O que dizer do jovem Lovechi e seu sonho de ser piloto, brutalmente abortado por uma bomba colocada no consulado americano em São Paulo. Revejam seus conceitos amigos e encarem o dilema de Sofia. A história tem que ser recontada sem pré-julgamentos. Que se punam os agentes torturadores do Estado que excederam suas ações, mas que igual remédio se aplique aos enganadores, que se enriqueceram e ganharam celebridade fazendo de suas ideologias e de suas mãos instrumentos induzir jovens inocentes a uma luta fratricida e levar terror a muita gente inocente.
É um alento, embora saibamos que somos minoritários, neste momento.
Não se pode colocar uma pedra não, há que se apurar toda a verdade e as "tenebrosas transações", para apagar essa mancha que permanece em nossa História.Muitos dos culpados ainda estão mandando, com a conivência e cumplicidade de muitos daqueles que foram vítimas. Céus e terra clamam por justiça.
Edmílson Martins(ex-preso político)
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