Os três Brasis
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- Plínio de Arruda Sampaio
- 28/09/2009
A dificuldade maior para entender este nosso país é que não há um Brasil: o Brasil é três.
Há o Brasil de 50 milhões de pessoas, com uma renda per capita comparável à dos países europeus de nível médio. Este país é dono de 323 milhões de hectares de terras aráveis, detentor das maiores reservas de água potável do planeta; de enormes reservas de gás combustível e de petróleo; da quarta província mineral e do décimo parque industrial do mundo. Para explorar essa riqueza, dispõe de uma força de trabalho versátil, disciplinada e dócil. A parte superior desse contingente populacional (o 1% de brasileiros, 2 milhões de pessoas) tem uma renda mensal de 20.000 dólares, que declina gradualmente até patamares de 1.500, 2000 dólares mensais – um conjunto de 50 milhões de gente endinheirada.
Este Brasil vai muito bem, obrigado. Se melhorar, piora.
O Brasil nº. 2 tem cerca de uns 120 milhões de pessoas e uma boa parte desse total não vai indo de todo mal. Ou melhor: não percebe que está recebendo uma educação insuficiente, cuidados de saúde precários, aposentadorias aviltadas, e que, amanhã, vai pagar tudo isso. Mas, hoje, o gasto que faz com o dinheiro que está recebendo é suficiente para ajudar a diminuir o impacto da crise econômica em nosso país.
O problema grave dessa porção majoritária da Nação é a alienação, no que esta tem de empobrecimento intelectual e de corrosão do caráter. O pavor de ser rebaixado ao andar térreo impede que esse enorme contingente populacional se solidarize com os marginalizados do consumo e da cidadania. Por isso, esse enorme contingente populacional constitui uma força conservadora e, em algumas situações, até mesmo reacionária.
O Brasil nº. 3 é onde uns 60 milhões de brasileiras e brasileiros amargam uma vida de frustrações e de miséria.
Este Brasil vai de mal a pior. Porém, não se dá muito conta disso, porque está recebendo um subsídio mensal do governo e, com essa quantia, engana a fome.
Uma das seqüelas perversas da sua pobreza é a cadeia de corrupção a que ela dá origem: começa quando o narcotráfico contrata o menino para fazer entrega de droga e culmina nos mais altos estratos da pirâmide social e nos escalões superiores do Estado.
Os problemas desse Brasil fraturado não são apenas a carência material dos mais pobres e o sofrimento que tal carência carreta, mas a impossibilidade de coesão social, sem a qual nenhum aglomerado humano consegue superar a barbárie e transformar-se em uma Nação civilizada.
Portanto, quem nasceu no Brasil nº. 1 carrega consigo um problema moral: a difícil opção entre o desfrutar irresponsável do seu status financeiro e social, e o arriscar carreira, status e até mais, a fim de construir com os outros dois Brasis uma Nação, autônoma, justa, solidária, capaz de partilhar da luta por uma Humanidade livre da dominação capitalista.
Dessa opção depende o valor moral de cada um dos milhões que vivem bem.
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Comentários
Suas opiniões estão ótimas. Apenas conserte a palavra exceções.
Abraços.
Lendo seu comentário, sincera e fraternalmente, não vejo como você pode concordar comigo.
Apesar de discordar dele neste artigo tenho o maior respeito pelo companheiro Plínio e discordo da caracterização que você faz dele.
Meu comentário não teve em nenhum momento o objetivo de "exigir" auto-crítica de ninguém. Não é assim que dialogo.
Por último, qualquer comparação do PSOL com o PT é tão estapafúrdia que peço, com todo o respeito, que o companheiro faça a auto-crítica de sua concordância comigo.
Alguém é capaz de tirar a responsabilidade de cada um, de todos por essa situação que vivemos? Quem é que está, ou não está propositadamente querendo tirar vantagens? Quem é que está disposto a ceder privilégios?
Uma pena não termos vontade de reinterpretar noutros termos esse Um Brasis.
Nem peço mais autocrítica, acho que o Plínio é isso mesmo que parece.
Por isso que eu digo que o PSOL é muito parecido como PT.
O conservadorismo está infiltrado nos 3 níveis, por causa da qualidade da comunicação que os atravessa. As mensagens vem de onde, quem as divulga? Não vamos mudar nada se não conseguirmos que todos influenciem no nosso destino, que todos sejam ouvidos.
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