Burguesia generosa
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- Gilvan Rocha
- 07/06/2013
É claro que alguém que se proclame um químico não o seja a partir, apenas, dessa autoproclamação. O mesmo se aplica à física, à biologia, às ciências médicas... Isso quer dizer, não é químico, físico, biólogo ou médico aqueles que simplesmente se rotulam.
Esse mesmo raciocínio devemos ter em relação ao socialismo científico, chamado, por injunção histórica, de marxismo. Ser marxista não é uma simples profissão de fé, é a tomada de consciência da questão social e política, a partir de um prisma fundado em elementos teoricamente consistentes.
O socialismo científico apóia-se no tripé: a filosofia (materialismo dialético), a economia (teoria do valor) e a política (materialismo histórico). Além de conhecer as partes constituintes do marxismo, é necessário que se tenha total comprometimento com suas linhas mestras e a partir delas traçar os caminhos de sua militância.
Dito isso, causa-nos perplexidade quando assistimos a existência de uma legião imensa de “marxistas”, patrocinados, regiamente, pelas universidades burguesas, quando temos sã consciência de que essas instituições propõem-se unicamente a cumprir duas tarefas: a primeira delas, consolidar a ideologia do sistema capitalista; e a segunda, tão importante quanto a primeira, de produzir mão de obra qualificada para servir às diversas demandas desse mesmo sistema.
Dessa forma, é estranho que a burguesia tenha se tornado tão generosa, patrocinando a construção de uma consciência política de caráter revolucionário, como é o marxismo, cujo conteúdo precípuo é justamente a negação radical da ordem capitalista.
Além de patrocinar os “marxistas legais”, conferindo-lhes bons salários, títulos e status, a burguesia, num gesto de generosidade “democrática”, vai bem além, financiando eventos como palestras, seminários, cursos e outros estudos de natureza pretensamente marxista. Seria apenas intrigante, se não fosse uma fraude colossal, pretender-se que a festejada academia burguesa possa abrigar, gerenciar e patrocinar o marxismo.
Cremos relevante observar a abismal diferença entre a vida militante dos “marxistas legais” e os ilegais, como Karl Marx, Rosa Luxemburgo, Vladimir Lênin, George Plekanov, Julio Martov, Leon Trotski e alguns outros próceres ativistas do socialismo revolucionário.
Enquanto, como já ressaltamos, os “marxistas legais” são alvos da “generosidade” da burguesia, os velhos marxistas foram objeto de permanente perseguição, levando-os a terem uma vida errante, marcada por testemunhos de completa intolerância por parte, regra geral, dos governos burgueses.
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Gilvan Rocha é presidente do Centro de Atividades e Estudos Políticos – CAEP.
Comentários
Em tempo: nenhum dos clássicos citados escrevia blog!
Também parece acreditar, de modo simplista, que o Estado é simples instrumento neutro que a burguesia manipula à vontade.
Esquece o articulista que a universidade pública é uma bandeira de movimentos populares. Os estudantes ingressam nelas por vestibular, e os professores, por concurso público. A universidade, em regimes liberais-democráticos, possui uma autonomia relativa, elegendo seus gestores por eleição corporativa interna.
Do jeito que o articulista escreve, parece que "a burguesia" simplesmente contrata quem quiser para lecionar em universidades. Como se qualquer regime político fosse igual às autocracias dos imperadores prussianos, alemães e russos que perseguiram Karl Marx, Rosa Luxemburgo, Vladimir Lênin, George Plekanov, Julio Martov, Leon Trotski. Foi preciso muita luta e sacrifício para que qualquer cidadão tivesse o direito de prestar concurso para lecionar em universidades públicas, sem precisar apresentar atestado ideológico.
Está precisando atualizar um pouco a sua reflexão teórica.
Lembro que de todas as lideranças citadas no texto, nenhuma era operária e todos passaram pela universidade.
Portanto, este artigo é muito injusto com a minoria que resiste e que pretende construir uma outra universidade!
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