O crescimento do PIB: A conspiração triunfalista
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- Bernardo Kucinski
- 24/09/2007
Praticamente todos os jornais e telejornais exaltaram o
crescimento acelerado do PIB no segundo trimestre deste ano: nada menos do que
5,4% em comparação com o mesmo trimestre do ano passado. “O melhor resultado em
não sei quantos anos", proclamavam as manchetes. “A maior a taxa de
investimento desde não sei quando”. “Indústria se destaca com expansão de
6,8%”, “Consumo avança 5,9%”. E assim por diante.
Houve pequenas restrições aqui e ali dos comentaristas de sempre, inconformados
com o que parece ser a consagração da política econômica do governo. Mas nem
eles deixaram transparecer que se tratava de uma fraude estatística. Um caso
clássico em que você usa verdades para dizer uma mentira.
A verdade é que o PIB de fato está 5,4% acima do que estava há doze meses.
Também é verdade que continua se expandindo. Mas é mentira que esteja havendo
crescimento acelerado. O crescimento está, isso sim, perdendo fôlego. Está se
desacelerando: de 2,8% de expansão no terceiro trimestre do ano passado em relação
ao trimestre anterior, caiu para 1% no trimestre seguinte, para 0,9% no
primeiro trimestre deste ano e para apenas 0,8 % agora.
Nesse ritmo, pode ser que já tenha parado de crescer em julho-agosto. O
mais provável , mantida a curva dos últimos 12 meses, é que cresça apenas 0,7%
no trimestre julho–setembro. Ao ritmo de 0,8%, dá menos que 3,5% no ano como um
todo. E ao ritmo de 0,7% dá menos que 3%. Um crescimento anêmico, no cenário
fortemente expansivo de hoje em todo o mundo.
Apenas dois jornais dos muitos que consultei registraram esses números. O Jornal
do Commércio, do Rio de Janeiro, especializado em economia deu a série
estatística que mostra a perda de fôlego do crescimento do PIB trimestral a
partir do ultimo trimestre do ano passado. Mesmo assim, adotou o tratamento
triunfalista do resto da mídia invertendo, portanto, o sentido dos números que
próprio jornal estampava com destaque.
Já o Estadão comentou explicitamente a perda de fôlego em seu editorial
principal intitulado “Boas e Más Notícias do PIB”. Disse o jornal: “Entre abril
e junho, a produção foi apenas 0,8% maior que no trimestre imediatamente
anterior. Nessa comparação, os números são decrescentes: 2,8% no terceiro
trimestre de 2006, 1% no quarto e 0,9% no primeiro deste ano”. Diz ainda o
editorial: “A economia tem se mantido em expansão, ma parece perder impulso
gradualmente”. Curiosamente, o noticiário do jornal não incorporou o
discernimento critico do seu editorialista. Foi tão triunfalista quanto o do
resto da mídia.
Agora, a pergunta que eu faço é a seguinte; então todos esses fazedores de
primeira página e comentaristas de plantão, não perceberam a perda de fôlego do
PIB? Só o editorialista do Estadão é que percebeu? Não viram que o
press- release do Banco Central tentou tapear todo mundo usando o velho truque
estatístico de escolher uma base de comparação conveniente? Uma base de 12
meses antes, quando a medida de PIB trimestral foi inventada justamente para
ser um flagrante do crescimento, para ser comparada com o trimestre
imediatamente anterior e não com o de um ano atrás.
Conspiração ou mera bobeira dos jornalistas, não importa. O que importa é que
esse tratamento favoreceu a decisão do Copom de reduzir o ritmo de corte da
taxa de juros. Como queriam os banqueiros.
Artigo originalmente publicado em www.cartamaior.com.br
Bernardo Kucinski é jornalista.
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