Eleições, Programa e Método
- Detalhes
- Murilo Gaspardo
- 17/04/2014
Desde a divulgação da pesquisa Datafolha do último dia 6 de abril, cujas informações mais destacadas são a queda nas intenções de voto na presidente Dilma Rousseff (PT), de 44% para 38%, e a estagnação dos candidatos oposicionistas Aécio Neves (PSDB), que permanece com 16%, e Eduardo Campos (PSB), que oscilou de 9% para 10%, há análises para todos os gostos tentando explicar os números e fazer projeções para o futuro.
No campo governista, afirma-se, por exemplo, que, não obstante as muitas notícias negativas em relação ao governo nas últimas semanas (Petrobras, inflação, baixo crescimento econômico etc.), o atual cenário continua a indicar vitória da presidente no primeiro turno, e os que desejam mudanças consideram que os mais habilitados para promovê-la seriam, em primeiro lugar, Lula, seguido de Marina Silva e de Dilma Rousseff. Do lado da oposição, são ressaltados o desejo por mudanças da população, o fato de que seus candidatos ainda são poucos conhecidos, o entusiasmo do “mercado” com a queda de avaliação do governo etc.
A mesma pesquisa ainda revela que aproximadamente um terço do eleitorado brasileiro, embora não pretenda votar na presidente, também não se identifica com as principais opções oferecidas pela oposição. Talvez isto possa ser explicado pela inconsistência da alternativa oferecida por tais candidatos, que poderia ser sintetizada na ideia segundo a qual é preciso um “choque de gestão” para reequilibrar as contas públicas, livrar o Estado do aparelhamento partidário e recuperar a confiança do “mercado” para que a economia volte a crescer, a inflação seja controlada e os serviços públicos sejam melhores.
Entretanto, questiona-se, em primeiro lugar, como as lideranças e partidos que defendem tal alternativa agiram ao governar: não houve nenhuma forma de apropriação privada do Estado? A economia caminhou bem em termos de crescimento econômico e emprego? Os serviços públicos de saúde e educação eram modelos de universalização e qualidade? Os que defendem a “nova política” também a praticam?
Em segundo lugar, temos as indagações sobre o “como fazer”. Tomemos apenas o exemplo do reequilíbrio das contas públicas. Não obstante a reconhecida necessidade de melhorar a eficiência do gasto público, combater-se a perda de recursos pela corrupção e diminuir-se o contingente de funcionários comissionados, diversos estudos apontam que as grandes despesas que, de fato, impactam no orçamento são aquelas com pagamento de juros da dívida pública e os “gastos sociais”, em sua maioria definidos constitucionalmente ou na legislação infraconstitucional, sobretudo com a previdência social.
O que pretende, concretamente, a oposição fazer? Reduzir os valores reservados para o pagamento da dívida pública e de seus juros? Tudo indica que não. Reduzir os “gastos sociais”? Mas começariam pelo fim da política de aumentos reais do salário mínimo ou pela redução do “Bolsa Família”? Todos juram que não fariam nenhuma das duas coisas. Ou por uma nova reforma na Previdência? Ninguém toca neste assunto.
Ora, por mais que muitos tentem reduzir o debate eleitoral à verificação de “quem é mais eficiente, ou preparado, para gerir o Estado e a economia”, ou a quem é “mais ético”, não é possível afastar o elemento conflitual que se encontra na essência da política, a qual continua a ser o campo de mediação dos conflitos sociais pela distribuição dos recursos materiais, pelo acesso a bens imateriais e pela liberdade de expressão das diversas concepções de vida.
Mas por que não se consegue inserir no centro do debate político propostas norteadas pela radicalização da democracia política, econômica e social, não obstante os esforços empreendidos por muitas lideranças políticas e sociais, como as que escrevem neste espaço?
Obviamente, a posição da grande mídia, as barreiras impostas pelo poder econômico, a desagregação social típica da “pós-modernidade” são explicações importantes. Entretanto, não podemos nos conformar com isto.
Assim, a ampliação do debate, não só em torno da renovação dos programas, mas também quanto aos métodos de interlocução com a sociedade brasileira, é necessária e urgente, pois render-se ao pragmatismo político para vencer as eleições e conquistar “avanços possíveis dentro das regras estabelecidas”, ou então, conservar a firmeza de princípios, mas sem conseguir concretizá-los, não podem ser as únicas opções de atuação política disponíveis.
Murilo Gaspardo é professor de Ciência Política e Teoria do Estado da UNESP/Campus de Franca. Doutor em Direito do Estado pela USP.