Questões sanitárias
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- Rodrigo de Oliveira Andrade
- 17/12/2010
Elaborado por representantes dos principais Movimentos da Reforma Sanitária, o documento "Uma agenda estratégica para a saúde do Brasil" foi entregue, no último dia 1º de dezembro, à presidente eleita Dilma Rousseff durante reunião realizada no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) - sede do governo de transição -, em Brasília.
Entre as entidades que elaboraram o documento estão a Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva (ABRASCO), a Associação Paulista de Saúde Pública (APSP), o Centro Brasileiro de Estudos em Saúde (CEBES), o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS), o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS), a Rede Unida e a Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC).
O documento, fruto da reunião organizada pela ABRASCO com parceiros que integram o Movimento da Reforma Sanitária, além de destacar questões centrais a serem enfrentadas quanto à efetivação dos princípios e das diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS), apresenta propostas de políticas de saúde, baseadas na noção de justiça social, a fim de estabelecer uma interlocução permanente com o governo federal, buscando, assim, garantir não apenas os direitos civis e políticos da sociedade, mas, também, seus direitos sociais e ambientais.
De acordo com a "Agenda Estratégica", o principal obstáculo a ser superado é político. Isso porque os sinais sobre a via de integração e proteção social ainda não são suficientemente claros, haja vista que, apesar de o país viver uma nova conjuntura que fixa a perspectiva de mobilidade social, junto a uma melhor distribuição de riqueza, as ações e os serviços públicos de saúde ainda possuem bases de financiamento estreitas e iníquas.
Em 2009, por exemplo, enquanto o investimento per capita do SUS foi de R$ 449,93, o sistema de assistência médica suplementar gastou R$ 1.512,00 por usuário, sendo que, neste mesmo ano, cerca de 60% dos gastos públicos foram destinados à assistência médico-hospitalar e os 40% restantes aplicados em ações essenciais de saúde pública para toda a população. Segundo o documento, este tipo de investimento, além de atender aos interesses de empresas estrangeiras fabricantes de insumos – medicamentos e equipamentos médico-hospitalares –, ressalta a transferência de recursos públicos para as redes de mercantilização e financeirização da saúde.
O documento alerta, ainda, para o grande risco da consolidação de um apartheid no sistema público de saúde, no qual os que desfrutam de um melhor poder aquisitivo utilizam serviços privados, razoavelmente financiados, em parte com subsídios públicos, por meio do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDS), enquanto que a maior parcela da população utiliza serviços públicos nitidamente sub-financiados.
Além disso, de acordo com os signatários do documento, grandes hospitais e centros clínicos e de apoio diagnóstico e terapêutico, inclusive públicos, "adotam portas de entrada duplas", ao atender com padrões diferentes usuários do SUS e de planos privados.
Contudo, segundo o documento, "é socialmente desigual oferecer saúde à população por meio de planos privados que organizam o acesso aos serviços de saúde com base na capacidade de pagamento e não na necessidade de cuidados", que, por sua vez, baseia-se em um modelo público de atenção à saúde ancorada em práticas que, além de se contraporem à efetivação da integralidade, um dos princípios do SUS, negligenciam o investimento em tecnologias de promoção da saúde, ao reproduzir e expandir a lógica de entendimento sintomático e curativo, baseado no consumo de procedimentos.
Sendo assim, as propostas para o enfrentamento dos problemas de caráter estrutural e conjuntural do sistema de saúde brasileiro, apresentadas pela "Agenda Estratégica", caminham no sentido de alertar o governo federal para a necessidade de se avançar, nos próximos quatro anos, no financiamento da saúde, objetivando a aplicação de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) no setor – atualmente, a proporção dos gastos públicos em saúde não ultrapassa 4% do PIB – e na regulação do setor privado, garantindo a capacidade de intervenção da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), orientada pelo interesse público, eliminando os subsídios públicos aos planos e seguros privados de saúde.
O documento defende, também, o fortalecimento da capacidade gerencial do Ministério da Saúde para que o mesmo estabeleça metas de elevação da qualidade e da efetividade das respostas das instituições da saúde, que, por sua vez, precisam adotar um modelo de atenção à saúde ancorado no fortalecimento e expansão contínua das estratégias de promoção da integralidade e da universalidade da atenção à saúde.
Para isso, destaca a Agenda, a busca por uma articulação entre as políticas de saúde, de ciência e tecnologia e de indústria e comércio, de modo a proporcionar ao SUS os insumos necessários ao enfrentamento dos problemas de saúde dos brasileiros, precisa ser priorizada pelo novo governo.
Rodrigo de Oliveira Andrade é jornalista.
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