Correio da Cidadania

A proteção à infância e às famílias de menor renda no Brasil e na Argentina: alguns dados contra a mitologia tucano-petista

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Com a es­ta­bi­li­zação mo­ne­tária de 1994, teve início uma con­tínua ele­vação do nível de vida dos bra­si­leiros mais po­bres, vi­a­bi­li­zada pelo fim da cor­rosão in­fla­ci­o­nária e re­for­çada por dois me­ca­nismos prin­ci­pais. O pri­meiro deles é a po­lí­tica de au­mento real do sa­lário mí­nimo ini­ciada em 1995, com FHC, e in­ten­si­fi­cada a partir de 2003, ano da posse de Lula. O se­gundo é cons­ti­tuído pelos pro­gramas de trans­fe­rência de renda fo­ca­li­zados nas fa­mí­lias que te­nham cri­anças em sua com­po­sição e es­tejam abaixo da linha de po­breza – es­pe­ci­al­mente o bolsa-fa­mília, criado pelo mesmo Lula e que abrange, hoje, todos os de­mais. A fo­ca­li­zação dessas ações per­mitiu ao país tirar apro­xi­ma­da­mente 40 mi­lhões de pes­soas da po­breza. A sus­ten­ta­bi­li­dade dessas po­lí­ticas é as­se­gu­rada pela boa gestão econô­mica, ba­seada no equi­lí­brio fiscal e no res­peito aos con­tratos do Es­tado com ins­ti­tui­ções fi­nan­ceiras in­ter­na­ci­o­nais e con­ces­si­o­ná­rias de ser­viços pú­blicos.

A Ar­gen­tina, ao con­trário, des­viou-se desse ca­minho. Lá, a úl­tima dé­cada teve como nota a ex­pansão de­sen­freada do gasto pú­blico, com­ple­men­tada por uma su­cessão de des­va­rios es­ta­ti­zantes. Isso con­duziu o Es­tado pla­tino ao iso­la­mento in­ter­na­ci­onal e, como re­sul­tado, sua eco­nomia está se dis­sol­vendo em meio à alta in­flação e à es­cassez de dó­lares. A po­pu­lação afunda na po­breza, faltam pro­dutos bá­sicos e o país está à beira da quebra. En­quanto isso, o go­verno ma­ni­pula ín­dices e a pre­si­denta de­lira.

Isso re­pete, diu­tur­na­mente, a im­prensa oli­gár­quica e/ou mer­cantil daqui e de lá. Como dizem os ar­gen­tinos, allá ellos. Em ou­tros tempos, veí­culos como Globo, Folha e Veja pre­ci­sa­riam ser re­fu­tados; hoje, após ca­varem a se­pul­tura de sua pró­pria cre­di­bi­li­dade, nem isso me­recem. O pro­blema é que, com va­ri­a­ções na ên­fase con­fe­rida ao papel dos go­vernos FHC e Lula/Dilma, este é também o re­lato he­gemô­nico entre in­te­lec­tuais li­gados ao PT e ao PSDB. Até mesmo per­so­na­li­dades vin­cu­ladas à es­querda mais ra­dical (PSTU, PSOL, PCB) en­golem a peta da re­dução da po­breza e da de­si­gual­dade ope­rada pelo Plano Real e pelo bolsa-fa­mília. No má­ximo, agregam a esse re­co­nhe­ci­mento al­gumas la­mú­rias pelo des­va­ne­ci­mento do ím­peto re­vo­lu­ci­o­nário das classes su­pos­ta­mente fa­vo­re­cidas por essas po­lí­ticas. Os dois pa­rá­grafos an­te­ri­ores já fazem parte do senso comum da classe média bra­si­leira [1] – ou ao menos de sua fatia ci­vi­li­zada, já que a outra tem crenças dis­tintas que serão tra­tadas na se­gunda parte deste ar­tigo.

Há, en­tre­tanto, um pro­blema in­so­lúvel com essa nar­ra­tiva: ela é in­tei­ra­mente falsa. Inú­meros in­di­ca­dores se­riam ca­pazes de de­monstrá-lo. As taxas de cres­ci­mento da eco­nomia, por exemplo: desde 2003, quando as­sumem Kir­chner e Lula, o PIB ar­gen­tino – mesmo quando me­dido pelos cri­té­rios de agên­cias opo­si­toras [2] – cresce muito mais que o bra­si­leiro em todos os anos.

Mas já nos disse a se­nhora Rous­seff que “uma grande nação deve ser me­dida por aquilo que faz para suas cri­anças e para seus ado­les­centes. Não é o Pro­duto In­terno Bruto, é a ca­pa­ci­dade do país, do go­verno e da so­ci­e­dade de pro­teger o que é o seu pre­sente e o seu fu­turo” [3]. Ve­jamos, então, como se sai o Brasil neste tema após o oc­tênio tu­cano e o de­cênio pe­tista, to­mando como termo de com­pa­ração a su­pos­ta­mente fa­lida e caó­tica Ar­gen­tina e co­te­jando os va­lores e con­di­ções de acesso dos pro­gramas de Se­gu­ri­dade So­cial des­ti­nados, lá e aqui, a fa­mí­lias com cri­anças e/ou ado­les­centes.

Tra­ba­lha­dores em­pre­gados na eco­nomia formal: sa­lário-fa­mília x asig­na­ción por hijo

Co­me­cemos pela eco­nomia formal e pelos tra­ba­lha­dores em­pre­gados. A pres­tação de Se­gu­ri­dade So­cial bra­si­leira re­la­tiva à in­fância e des­ti­nada a esse pú­blico é o sa­lário-fa­mília. Já seu cor­re­lato na Ar­gen­tina chama-se asig­na­ción por hijo. Ambas são cus­te­adas pelas con­tri­bui­ções pre­vi­den­ciá­rias e ad­mi­nis­tradas pelas res­pec­tivas au­tar­quias do setor (INSS e Anses).

No Brasil, o sa­lário-fa­mília é de 22 reais por filho, pagos a quem tenha re­mu­ne­ração mensal bruta até R$ 915,05; há, em tese, uma faixa na qual o valor seria de 31 reais, mas, como seu teto (R$ 608,80) é menor que o sa­lário mí­nimo (R$ 622), sua exis­tência é mesmo apenas teó­rica. Na Ar­gen­tina, a asig­na­ción por hijo vai de $ 340 (R$ 162[4]) a $ 733 (R$ 349[5]) por filho quando a re­mu­ne­ração bruta dos pais, so­mada, for de até $ 3,2 mil (R$ 1.523); $ 250 (R$ 119) a $ 662 (R$ 315) se es­tiver entre isso e $ 4,4 mil (R$ 2.095); $ 160 (R$ 76) a $ 635 (R$ 302) caso su­pere esse teto sem passar de $ 6 mil (R$ 2.857); e $ 90 a $ 357 (R$ 43 a R$ 170) para o úl­timo es­trato, no qual se si­tuam os pais com renda so­mada su­pe­rior a esse li­mite e até $ 14.000 (R$ 6,7 mil). Nessa úl­tima faixa, o be­ne­fício só é de­vido se a renda de ne­nhum deles su­perar $ 7 mil (3,3 mil).

Mesmo con­si­de­rando que no Brasil podem ser pagos dois sa­lá­rios-fa­mília (ao pai e à mãe) pela mesma cri­ança e na Ar­gen­tina não, a di­fe­rença é cho­cante, mais ainda con­si­de­rando que esse com­pa­ra­tivo se re­fere a cri­anças com boa saúde. Se o filho tiver al­guma de­fi­ci­ência, a Se­gu­ri­dade So­cial ar­gen­tina paga ao pai ou à mãe um valor mensal entre $ 1.200 (R$ 575) e $ 2.400 (R$ 1.150) na pri­meira faixa de renda; $ 900 (R$ 430) e $ 2.400 (R$ 1.150) na se­gunda; e $ 600 (R$ 286) a $ 2.400 (R$ 1.150) se a renda bruta dos ge­ni­tores su­perar $ 4,4 mil (R$ 2,1 mil), sem o teto apli­cável or­di­na­ri­a­mente.

O pro­blema co­meça nesses nú­meros, mas não ter­mina neles. O sa­lário-fa­mília bra­si­leiro só pode ser pago entre o nas­ci­mento e o dia em que a cri­ança com­pleta 14 anos de idade; o ar­gen­tino, da con­cepção [6] até o ani­ver­sário de 18 anos (nos dois casos, o li­mite etário não se aplica aos fi­lhos de­fi­ci­entes). No Brasil, apenas os em­pre­gados não-do­més­ticos com car­teira as­si­nada, tra­ba­lha­dores avulsos [7] e apo­sen­tados o re­cebem – mas, no úl­timo caso, apenas se a apo­sen­ta­doria tiver ocor­rido na con­dição de em­pre­gado ou avulso e se ti­verem mais de 65 (ho­mens) ou 60 anos (mu­lheres) ou ti­verem se apo­sen­tado por idade ou in­va­lidez. Sua ne­ga­tiva a quem tenha se apo­sen­tado em outra ca­te­goria que não as de em­pre­gado e autô­nomo, diga-se de pas­sagem, de­corre de um dis­po­si­tivo ilegal, o art. 82, IV, do De­creto 3.048, que in­fringe o art. 65, § único da Lei 8.213. Já na Ar­gen­tina, não há idade mí­nima para a asig­na­ción por hijo aos apo­sen­tados nem às pen­si­o­nistas – que, assim como os be­ne­fi­ciá­rios do se­guro-de­sem­prego, lá têm acesso a ela e aqui não.

Critérios de concessão e pagamento: salário-família x asignación por hijo e asignación por hijo com discapacidad
País Argentina Brasil
Quem tem direito Empregados não-domésticos com registro; aposentados, pensionistas, beneficiários do seguro-desemprego Empregados não-domésticos e trabalhadores avulsos, com registro; aposentados na condição de empregado não-doméstico ou trabalhador avulso, desde que tenham mais de 65(h) ou 60(m) anos ou tenham se aposentado por idade ou invalidez
Limite de renda Padrão Filho deficiente R$ 915,05 ($ 1.922) por genitor
$ 14 mil (R$ 6,7 mil) na soma dos genitores, desde que nenhum tenha renda superior a $ 7 mil (R$ 3,3 mil) Sem limite
Valor unitário (por filho) Obs: não há limitação por número de filhos, nem no Brasil, nem na Argentina Padrão Filho deficiente R$ 22 ($ 46)   R$ 44 ($ 92), caso pai e mãe se enquadrem nos critérios acima
Soma de remuneração mensal bruta dos pais até $ 3,2 mil (R$ 1,5 mil): $ 340 (R$ 162), podendo chegar a $ 733 (R$ 349) para empregados Soma de remuneração mensal bruta dos pais até $ 3,2 mil (R$ 1,5 mil): $1,2 mil (R$ 575), podendo chegar a $ 2,4 mil (R$ 1,1 mil) para empregados
Soma de remuneração mensal bruta dos pais até $ 4,4 mil (R$ 2,1 mil): $ 250 (R$ 120), podendo chegar a $ 662 (R$ 320) para empregados e a $ 331 (R$ 160) para aposentados e pensionistas Soma de remuneração mensal bruta dos pais até $ 4,4 mil (R$ 2,1 mil): $ 900 (R$ 430), podendo chegar a $ 2,4 mil (R$ 1,1 mil) para empregados e $ 1,2 mil (R$ 575) para aposentados e pensionistas)
Soma de remuneração mensal bruta dos pais até $ 6 mil (R$ 2,8 mil): $ 160 (R$ R$ 70), podendo chegar a $ 635 (R$ 300) para os empregados e a $ 318 (R$ 155) para aposentados e pensionistas Soma de remuneração mensal bruta dos pais superior a $ 4,4 mil (R$ 2,1 mil): $ 600 (R$ 286), podendo chegar a $ 1,2 mil (R$ 575) para aposentados e pensionistas)
Soma de remuneração mensal bruta dos pais até $ 14 mil, não podendo nenhum deles receber mais de $ 7 mil: $ 90 (R$ 43), podendo chegar a $ 357 (R$ 170) para os empregados e $ 179 (R$ 85) para aposentados e pensionistas
Início Concepção (ou adoção) Nascimento (ou adoção)
Término Padrão Filho com deficiência 14 anos (sem limite para filhos inválidos)
18 anos Sem limite

Até aqui, a com­pa­ração foi pos­sível por exis­tirem, nos dois países, ins­ti­tutos equi­va­lentes. Mas a Se­gu­ri­dade So­cial ar­gen­tina abrange, ainda, pres­ta­ções ine­xis­tentes no Brasil, como o be­ne­fício de par­cela única pago quando do parto, no valor de $ 600 (R$ 286). Dizer que aqui não há algo assim não é igual, neste caso, a dizer que a le­gis­lação bra­si­leira não prevê nada do tipo: a LOAS obriga os mu­ni­cí­pios a pagar um be­ne­fício-na­ta­li­dade e o INSS a fazê-lo en­quanto isso não ocorrer. Porém, essa pres­tação – que va­leria, hoje, R$ 85 pelos cri­té­rios de re­a­juste ado­tados desde então pela Pre­vi­dência – foi ex­tinta por um de­creto ilegal de FHC nos úl­timos dias de 1995 [8]. O que não existe no Brasil nem mesmo em tese é a ajuda es­colar de $ 170 (R$ 81) a $ 680 (R$ 324), paga anu­al­mente, ou o be­ne­fício por adoção de $ 3,6 mil (R$ 1.714) em cota única.

É ainda digno de nota que, em 2006, o Con­gresso aprovou a Lei 11.324, cujo art. 3º es­tendia o sa­lário-fa­mília às em­pre­gadas do­més­ticas. Ao san­cioná-la, Lula, ale­gando falta de re­cursos, vetou-o. Na jus­ti­fi­ca­tiva do veto – aca­tado pelo Le­gis­la­tivo –, a des­pesa que essa ex­tensão acar­re­taria ao INSS era es­ti­mada em R$ 318 mi­lhões por ano. Con­si­de­rando que isso equi­vale a 0,1% do gasto anual do Re­gime Geral de Pre­vi­dência So­cial (RGPS), fica claro que a pre­o­cu­pação era outra: pro­teger so­ne­ga­dores contra uma ava­lanche de pro­cessos, dado que 70% dessa ca­te­goria tra­ba­lham sem car­teira as­si­nada [9] e o acesso ao sa­lário-fa­mília de­pende da for­ma­li­zação do vín­culo de em­prego.

Po­pu­lação de menor renda: bolsa-fa­mília x asig­na­ción uni­versal por hijo para pro­tec­ción so­cial

O que se alar­deia como grande feito do de­cênio pe­tista, no en­tanto, não é o sa­lário-fa­mília, mas o pro­grama bolsa-fa­mília (PBF), de trans­fe­rência de renda a fa­mí­lias em si­tu­ação de po­breza ou ex­trema po­breza. Os va­lores mo­ne­tá­rios que de­li­mitam esses qua­dros foram es­ta­be­le­cidos por de­creto e são, hoje, R$ 140 ($ 294) e R$ 70 ($ 147) per ca­pita ao mês, res­pec­ti­va­mente.

O go­verno ar­gen­tino, que tem fama de ma­ni­pular in­di­ca­dores, não chegou a tanto. O ques­ti­o­nado Indec fixa a linha de po­breza em $ 1.555 (R$ 740) para uma fa­mília de quatro pes­soas, o que dá $ 389, ou R$ 190, per ca­pita. A ob­ser­vação em­pí­rica de­monstra [10] que os preços de su­per­mer­cado na ca­pital ar­gen­tina são me­nores, na média, que os das ci­dades bra­si­leiras que lhe se­riam com­pa­rá­veis: São Paulo (maior centro in­dus­trial e fi­nan­ceiro), Bra­sília (ca­pital) e Rio de Ja­neiro (prin­cipal des­tino tu­rís­tico e polo cul­tural). Mas as ta­rifas pú­blicas na Ar­gen­tina são muito me­nores que no Brasil. Os va­lores do trans­porte co­le­tivo em Bu­enos Aires, por exemplo, são de $ 2 (R$ 0,95) para os ônibus, $ 2,50 (R$ 1,19) para o metrô e $ 1,50 (R$ 0,71) para os trens. Em São Paulo, o custo é de R$ 3 ($ 6,30) para qual­quer dessas op­ções. No Rio – única dessas ci­dades com um sis­tema de trans­porte com­pa­rável ao da ca­pital ar­gen­tina em abran­gência ter­ri­to­rial e ho­rária –, os ônibus custam R$ 2,75 ($5,77), os trens R$ 2,90 ($ 6,09) e o metrô R$ 3,20 ($ 6,72). No DF, a pas­sagem de ônibus sai a R$ 4 ($ 8,40) e a de metrô a R$ 3 ($ 6,20). Essa (des)pro­porção de preços se re­pete nas ta­rifas de água, luz, gás e te­le­fone. Do preço da mo­radia – para alu­guel ou compra –, é me­lhor nem falar.

Os va­lores trans­fe­ridos pelo PBF são R$ 32 ($ 67) men­sais por ges­tante, cri­ança de até 15 anos ou nu­triz, sendo que o total de be­ne­fí­cios ao con­junto dessas pes­soas não pode passar de cinco; e R$ 38 ($ 80) por ado­les­cente de 16 ou 17 anos, até o li­mite de dois. Para as fa­mí­lias si­tu­adas abaixo da linha de ex­trema po­breza do de­creto, há, ainda, um pa­ga­mento mensal fixo (in­de­pen­dente do nú­mero de fi­lhos) de R$ 70. Re­cen­te­mente, criou-se outro, cujo valor cor­res­ponde à di­fe­rença entre a renda per ca­pita fa­mi­liar (em cujo cál­culo in­cluem-se os be­ne­fí­cios an­te­ri­ores) e a linha de po­breza ex­trema.

Essa úl­tima pres­tação, paga a fa­mí­lias com cri­anças de até 6 anos, chama-se “be­ne­fício para su­pe­ração da ex­trema po­breza na pri­meira in­fância” e cons­titui um ver­da­deiro pro­dígio. Através dela, o go­verno da se­nhora Roussef pre­tende er­ra­dicar, por de­creto, a mi­séria. Mas só a mi­séria do de­creto.

A conta é sim­ples: di­vide-se o valor total au­fe­rido pela fa­mília pelo nú­mero de in­te­grantes e ve­ri­fica-se quanto falta para atingir uma renda per ca­pita de R$ 70,01, valor a partir do qual con­si­dera-se cru­zada a linha da po­breza ex­trema. Uma fa­mília com dez mem­bros e renda por pessoa de R$ 69,99, por exemplo, re­ce­beria R$ 0,20 (vinte cen­tavos), ar­re­don­dados – su­prema ge­ne­ro­si­dade! – para o nú­mero in­teiro par ime­di­a­ta­mente su­pe­rior, ou seja, R$ 2 (dois reais) por mês[11]. Pena que o efeito da má­gica ter­mina no dia em que a úl­tima cri­ança da fa­mília com­pleta 7 anos; afinal, os re­cursos são es­cassos, o país tem com­pro­missos a honrar (di­fe­ren­te­mente dos per­du­lá­rios ar­gen­tinos, que qui­taram sua dí­vida com o FMI e o Banco Mun­dial por 25% do valor de face) e, nessa idade, convém que os  bra­si­leiros já es­tejam pre­pa­rados para en­frentar as agruras da vida (os fi­lhos das fa­mí­lias abas­tadas, de­du­tí­veis do Im­posto de Renda dos pais até os 25 anos, são as­sunto para a se­gunda parte deste ar­tigo).

Essa é a me­to­do­logia que em­basa o anúncio de que 8,7 mi­lhões de bra­si­leiros saíram da in­di­gência entre maio e se­tembro, feito por Dilma em 03/10[12]. O go­verno bra­si­leiro não apenas ma­ni­pula in­di­ca­dores como leva muito a sério os in­di­ca­dores que ma­ni­pula.

Disso, pelo menos, não se pode acusar Cris­tina Fer­nández. Nada na Se­gu­ri­dade So­cial ar­gen­tina é con­di­ci­o­nado pela linha de po­breza do Indec e, em regra, os sa­lá­rios e pro­ventos au­mentam em per­cen­tuais muito mais pró­ximos à in­flação me­dida pelas con­sul­to­rias pri­vadas que aos ín­dices ofi­ciais [13]. Isso vale tanto para os fi­xados pelo go­verno (sa­lário mí­nimo, apo­sen­ta­do­rias) quanto para os de­fi­nidos por ne­go­ci­ação sin­dical. Vale também para a asig­na­ción uni­versal por hijo para pro­tec­ción so­cial (AUH), cujo valor por filho é o mesmo da asig­na­ción por hijo da menor faixa de renda, sem os acrés­cimos re­gi­o­nais. A AUH teve um au­mento de 26% em se­tembro úl­timo, pas­sando de $ 270 (R$ 129) para $ 340 (R$ 162) por cri­ança ou ado­les­cente. Para fi­lhos com de­fi­ci­ência, o valor é $ 1.200 (R$ 575) por cada um e não há li­mite de idade.

Para re­ceber a AUH, o que se exige é que ne­nhum dos ge­ni­tores tenha di­reito à asig­na­ción por hijo do tó­pico an­te­rior nem ganhe mais que o sa­lário mí­nimo – atu­al­mente, $ 2.670 [14] (R$ 1.271), mais que o dobro do vi­gente no Brasil [15]. Re­cebem a asig­na­ción uni­versal donas de casa, tra­ba­lha­doras in­for­mais, de­sem­pre­gadas que não es­tejam re­ce­bendo se­guro-de­sem­prego, tra­ba­lha­doras sa­zo­nais na en­tres­safra, mi­cro­em­pre­en­de­doras e tra­ba­lha­doras do­més­ticas (com ou sem vín­culo de em­prego), entre ou­tras. Há um li­mite de cinco be­ne­fí­cios por mãe, o que perfaz um teto de $ 1.700 (R$ 810). No caso de fi­lhos com de­fi­ci­ência, esse teto fica em $ 6.000 (R$ 2.857), na si­tu­ação ex­trema de um nú­cleo fa­mí­liar com cinco ou mais fi­lhos nessa con­dição.

Mães de 7 ou mais fi­lhos têm di­reito, ainda, a uma pensão as­sis­ten­cial vi­ta­lícia (ina­cu­mu­lável com a AUH) de $ 1.880 (R$ 895), valor ao qual se acresce, em al­gumas lo­ca­li­dades, um com­ple­mento por zona des­fa­vo­rável de 40%, pas­sando a $ 2.632 (R$ 1.253). Essa pensão é con­di­ci­o­nada aos re­qui­sitos de não estar am­pa­rada pelas ga­ran­tias da re­lação de em­prego, não ser ti­tular de apo­sen­ta­doria ou pensão por viuvez nem ter qual­quer outra renda maior que o pró­prio valor da pres­tação as­sis­ten­cial em questão. Para re­cebê-la, não é ne­ces­sário que os fi­lhos sejam me­nores, sol­teiros, nem que es­tejam vivos ou morem com a mãe.

Critérios de concessão e pagamento: programa bolsa-família (PBF) e asignación universal por hijo para protección social (AUH)
Programa PBF (Brasil) AUH (Argentina)
Limite de renda R$ 70 ($ 147) per capita R$ 140 ($ 194) per capita Salário mínimo ($ 2.670, R$ 1.271)
Valor mensal R$ 32 ($ 67) por gestante, criança de até 15 anos ou nutriz   R$ 38 ($ 80) por adolescente de 16 ou 17 anos R$ 70 ($ 147) por unidade familiar O necessário para que a renda per capita familiar atinja R$ 70,01 R$ 32 ($ 67) por gestante, criança de até 15 anos ou nutriz   R$ 38 ($ 80) por adolescente de 16 ou 17 anos $ 340 (R$ 162) por filho hígido   $ 1.200 (R$ 575) por filho deficiente
Número máximo de benefícios por família 5 para crianças até 15 anos, gestantes ou nutrizes;   2 para adolescentes 1 1 5 para crianças até 15 anos, gestantes ou nutrizes;   2 para adolescentes 5 (mães de 7 ou mais filhos podem optar por uma pensão de $ 1.880 [R$ 895] ou $ 2.632 [R$ 1.253])
Início Confirmação da gravidez, para as gestantes   Início da amamentação, para as nutrizes   Parto, para crianças   16 anos, para adolescentes Confirmação da gravidez Nascimento Confirmação da gravidez, para as gestantes   Início da amamentação, para as nutrizes   Parto, para crianças   16 anos, para adolescentes Concepção [16]
Término Parto ou aborto, para gestantes   Fim da amamentação, para nurizes   16 anos, para crianças   18 anos, para adolescentes Data em que o último filho completa 18 anos de idade Data em que a última criança completa 7 anos de idade Parto ou aborto, para gestantes   Fim da amamentação, para nurizes   16 anos, para crianças   18 anos, para adolescentes 18 anos   Sem limite de idade para filhos deficientes
Possibilidade de restrição orçamentária Sim Não

No que se re­fere aos fi­lhos com de­fi­ci­ência, convém ainda as­si­nalar que o be­ne­fício de pres­tação con­ti­nuada (BPC) [17] da Lei Or­gâ­nica da As­sis­tência So­cial (LOAS), equi­va­lente ao sa­lário mí­nimo, não pode ser con­si­de­rado um su­ce­dâneo da AUH, já que a Ar­gen­tina também tem uma pensão as­sis­ten­cial (não-con­tri­bu­tiva) por de­fi­ci­ência. Essa pensão é cu­mu­lável com a asig­na­ción uni­versal por hijo con dis­ca­pa­cidad, dado que o ti­tular de uma é a pró­pria pessoa com de­fi­ci­ência e o da outra é o pa­rente sobre quem re­caia o dever legal de pro­por­ci­onar-lhe am­paro econô­mico. Equi­vale a 70% da apo­sen­ta­doria mí­nima e está, hoje, em $ 1.326 (R$ 627), valor que se acresce em 40% nas zonas des­fa­vo­rá­veis, pas­sando a $ 1856 (R$ 884). Os re­qui­sitos de acesso a ela são uma in­ca­pa­ci­dade la­boral de 76% e renda pes­soal não maior que seu pró­prio valor.

Há, ainda, uma di­fe­rença entre a AUH e o PBF que não se traduz em nú­meros nem cabe em ta­bela ne­nhuma: a pri­meira é um di­reito pú­blico sub­je­tivo e um dever do Es­tado para com quem reúna os re­qui­sitos de acesso a ela; o se­gundo não. A lei que o ins­titui prevê – con­tra­ri­ando a pró­pria Cons­ti­tuição bra­si­leira, em cujos termos a As­sis­tência So­cial “será pres­tada a quem dela ne­ces­sitar” (art. 203) – que “o Poder Exe­cu­tivo de­verá com­pa­ti­bi­lizar a quan­ti­dade de be­ne­fi­ciá­rios do Pro­grama Bolsa Fa­mília com as do­ta­ções or­ça­men­tá­rias exis­tentes” (art. 6º § único). Para re­ceber o bolsa-fa­mília, não basta, por­tanto, se­quer a renda fa­mi­liar per ca­pita in­fe­rior a R$ 140, e nem mesmo a R$ 70: é pre­ciso contar com a boa von­tade do go­verno, do Con­gresso e rezar para que sobre di­nheiro su­fi­ci­ente de­pois que o Es­tado ter­mine de re­mu­nerar seus ren­tistas.

Con­clusão

Em­bora não seja – como deve estar claro a essa al­tura – o que diz a im­prensa mo­no­po­lista daqui e de lá, a Ar­gen­tina tam­pouco é um Es­tado de Bem-Estar es­can­di­navo. É, sim, um país onde o ca­pi­ta­lismo de­pen­dente en­contra-se em re­es­tru­tu­ração de­pois de quatro ca­tás­trofes con­se­cu­tivas que ele mesmo pro­vocou: o banho de sangue de 1974-83, a hi­pe­rin­flação de me­ados dos anos 80, o es­fa­ce­la­mento so­cial dos 90 e o co­lapso de 2001. Ainda assim, deve haver algum mo­tivo além do idioma para que seja Bu­enos Aires, e não o Rio ou São Paulo, o des­tino pre­fe­ren­cial dos tra­ba­lha­dores que emi­gram de países como Bo­lívia, Pa­ra­guai ou Peru em busca de uma vida me­lhor.

Esta não é uma ha­gi­o­grafia de Néstor Kir­chner e Cris­tina Fer­nández. O fato de o sa­lário mí­nimo ar­gen­tino ser o mais alto da Amé­rica La­tina não in­va­lida os mo­tivos das or­ga­ni­za­ções ar­gen­tinas de tra­ba­lha­dores para não es­tarem fe­lizes com seu úl­timo au­mento. O valor e abran­gência das asig­na­ci­ones por hijo não elidem o fato de que muitas fa­mí­lias ti­veram perdas quando o en­qua­dra­mento por faixa re­mu­ne­ra­tória passou a dar-se pela soma dos ga­nhos dos pais, e não pelo sa­lário do que ganha menos. O re­cente pro­jeto de re­forma da lei de aci­dentes de tra­balho é me­lhor que a le­gis­lação atual, mas fica aquém das de­ci­sões da Corte Su­prema sobre o as­sunto e não rompe com a con­cepção pri­va­tista her­dada dos anos 90 – di­fe­ren­te­mente do que ocorreu no caso dos fundos pri­vados de apo­sen­ta­do­rias e pen­sões, en­cam­pados por Cris­tina em 2008.

Tudo so­mado, a Ar­gen­tina é um país com um copo meio cheio e meio vazio. Cum­prindo seu papel, or­ga­ni­za­ções po­lí­ticas de es­querda e mo­vi­mentos po­pu­lares de lá apontam para a me­tade vazia. Aqui, por outro lado, al­gumas gotas já são su­fi­ci­entes para que quem mais devia manter o senso crí­tico (in­te­lec­tuais e sin­di­ca­listas, por exemplo) fes­teje. O lance mais re­cente dessa mis­tura de ofi­ci­a­lismo e ali­e­nação é um ma­ni­festo em que al­guns eco­no­mistas da Uni­camp só faltam ofe­recer ajuda hu­ma­ni­tária à Eu­ropa [18].

Re­co­nhecer as fra­quezas e con­tra­di­ções do Es­tado ar­gen­tino e de seus go­ver­nantes, por outro lado, só deixa ainda mais pa­tente a es­qua­lidez dos me­ca­nismos de pro­teção exis­tentes no Brasil às fa­mí­lias tra­ba­lha­doras e a seus fi­lhos. Afinal, não se está com­pa­rando ca­pi­ta­lismo com so­ci­a­lismo nem ca­pi­ta­lismo cen­tral com ca­pi­ta­lismo pe­ri­fé­rico. A questão, aqui, é tão só entre ca­pi­ta­lismos de­pen­dentes com e sem aquilo que, em bom es­pa­nhol, se cos­tuma chamar de hu­evos.

Hen­rique Jú­dice Ma­ga­lhães é Con­sultor do Pro­grama das Na­ções Unidas para o De­sen­vol­vi­mento (PNUD), com atu­ação junto ao Mi­nis­tério do De­sen­vol­vi­mento So­cial (MDS). Ex-pro­fessor dos ins­ti­tutos fe­de­rais de edu­cação, ci­ência e tec­no­logia do Rio Grande do Sul (IFRS) e Santa Ca­ta­rina (IFSC). Ex-fun­ci­o­nário do Ins­ti­tuto Na­ci­onal do Se­guro So­cial (INSS). Atuou como con­sultor da Or­ga­ni­zação In­ter­na­ci­onal do Tra­balho (OIT) e pes­qui­sador-bol­sista do Ins­ti­tuto de Pes­quisa Econô­mica Apli­cada (IPEA). Cursa atu­al­mente dou­to­rado em Di­reito na Uni­ver­sidad de Bu­enos Aires (UBA). As po­si­ções aqui ex­pressas são es­tri­ta­mente pes­soais e não cor­res­pondem ao juízo ofi­cial do PNUD ou de qual­quer outra ins­ti­tuição.

Notas

[1] A de ver­dade, não essa com renda fa­mi­liar per ca­pita entre R$ 291 e R$ 1.019 in­ven­tada por Ri­cardo Paes de Barros e Mar­celo Neri – agra­ci­ados pela pre­si­denta por essa im­pos­tura com uma as­ses­soria mi­nis­te­rial de alto nível e com a pre­si­dência do IPEA, res­pec­ti­va­mente.

[2] Por exemplo, http://​man​suet​o.​wor​dpre​ss.​com/​2012/​05/​02/​arg​enti​na-​eles-​mod​ific​am-​tambem-​o-​pib/. Que o go­verno ar­gen­tino infle o PIB e os ín­dices de cres­ci­mento, não é im­pos­sível. Mas Man­sueto de Al­meida (co­or­de­nador de Po­lí­tica Mo­ne­tária e Fi­nan­ceira do Mi­nis­tério da Fa­zenda na época do dólar a R$ 1) e ou­tros pa­pa­gaios da di­reita econô­mica ope­rante no Brasil des­con­fiam que até a CIA (http://​www.​ind​exmu​ndi.​com/​g/​g.​aspx?​c=ar&​v=66&​l=pt e http://​www.​ind​exmu​ndi.​com/​g/​g.​aspx?​v=66&​c=br&​l=pt) seja ma­ni­pu­lada pelo go­verno de Cris­tina Fer­nández.

[3] http://​www1.​folha.​uol.​com.​br/​fsp/​poder/​54216-​com-​eco​nomi​a-​em-​marcha-​lenta-​dilma-​diz-​que-​pib-​nao-​e-​tudo.​shtml

[4] Como an­te­paro à can­ti­lena sobre a in­flação ar­gen­tina e seus ín­dices ofi­ciais, Dis­pensou-se a con­versão pela pa­ri­dade de poder de compra (PPC). Optou-se pela con­versão na base de R$1=$2,10, que cor­res­ponde a uma taxa de câmbio es­tável ao longo dos dois ou três úl­timos anos. Caso se uti­li­zassem os dados PPC do FMI para 2011 (http://​pt.​wik​iped​ia.​org/​wiki/​Anexo:​Lista_​de_​pa%C3%ADs​es_​por_​PIB_​nominal_​per_​capitattp://​pt.​wik​iped​ia.​org/​wiki/​Anexo:​Lista_​de_​pa%C3%ADs​es_​por_​PIB_​%28P​arid​ade_​do_​Poder_​de_​Com​pra%29_​per_​capita), o re­sul­tado da com­pa­ração seria ainda mais fa­vo­rável à Ar­gen­tina. Os dados do FMI, como os da CIA, são ma­ni­pu­lados por Guil­lermo Mo­reno...

[5] A va­ri­ação de valor dá-se con­forme a re­gião do país. Em lo­ca­li­dades sub­po­vo­adas, com baixo nível de ati­vi­dade econô­mica ou muito frias, o valor é maior; a di­fe­rença, con­tudo, não se aplica aos be­ne­fi­ciá­rios do se­guro-de­sem­prego.

[6] Entre a con­cepção e o parto, o be­ne­fício chama-se asig­na­ción pre­natal; seus va­lores e cri­té­rios de con­cepção, porém, são os mesmos da asig­na­ción por hijo.

[7] Tra­ba­lha­dores avulsos, con­forme a lei bra­si­leira, são aqueles que prestam ser­viços a vá­rios pa­trões du­rante um mesmo mês, se­mana ou dia, tendo sua es­cala de ser­viço de­ter­mi­nada pelo sin­di­cato ou por um órgão gestor – caso dos es­ti­va­dores por exemplo.

[8] Ver http://​jus.​com.​br/​revista/​texto/​20880/​vig​enci​a-​de-​ben​efic​ios-​pre​vide​ncia​rios-​sup​osta​ment​e-​ext​into​s-​auxilio-​funeral-​e-​auxilio-​nat​alid​ade. De­ve­riam estar em vigor, desde 2008, os be­ne­fí­cios na­ta­li­dade e fu­neral es­ta­be­le­cidos na Re­so­lução 212 de 2006 do Con­selho Na­ci­onal de As­sis­tência So­cial (CNAS), mas, se­gundo le­van­ta­mento re­a­li­zado pelo MDS em 2009, menos de 30% dos mu­ni­cí­pios bra­si­leiros a cum­priam.

[9] O veto ao art. 3º da Lei 11.324 pode ser lido em http://​www.​pla​nalt​o.​gov.​br/​ccivil_​03/_​ato2004-​2006/​2006/​Msg/​Vep/​VEP-​577-​06.​htm. A des­pesa anu­a­li­zada do RGPS (02/2011 a 01/2012), em http://​g1.​globo.​com/​eco​nomi​a/​noticia/​2012/​03/​pre​vide​ncia-​reg​istr​a-​deficit-​de-​r-​3-​bilhoes-​em-​janeiro-​de-​2012.​html. O per­cen­tual de tra­balho sem car­teira entre as tra­ba­lha­doras do­més­ticas está em http://​www.​ebc.​com.​br/​2012/​09/​menos-​de-​um-​terco-​dos-​tra​balh​ador​es-​dom​esti​cos-​no-​brasil-​tem-​car​teir​a-​assinada.

[10] Quem quiser co­locar à prova esse dado não pre­cisa fazer mais que vi­ajar a Bu­enos Aires. Apro­veitem: está ba­rato.

[11] Cri­tério es­ta­be­le­cido no art. 19 § 3º do De­creto 5.209/04, na re­dação dada pelo De­creto 7.758/12: http://​www.​pla​nalt​o.​gov.​br/​ccivil_​03/_​ato2004-​2006/​2004/​Decreto/​D5209.​htm. Ali, en­con­tram-se também todos os va­lores aqui men­ci­o­nados re­la­tivos ao bolsa-fa­mília.

[12] http://​blog.​pla​nalt​o.​gov.​br/​brasil-​car​inho​so-​retirou-​cinco-​milhoes-​de-​cri​anca​s-​e-​jovens-​da-​extrema-​pobreza-​afirma-​dilma/

[13] Sem des­co­nhecer a tru­cu­lência da in­ter­venção no Indec, a di­fe­rença entre as re­a­ções da im­prensa mo­no­po­lista, das agên­cias pri­vadas e do FMI à ma­ni­pu­lação de nú­meros na Ar­gen­tina e no Brasil deve-se ao fato de que, lá, parte da re­mu­ne­ração do ca­pital mo­no­po­lista está atre­lada à in­flação ofi­cial. Em http://​www.​lan​acio​n.​com.​ar/​1146904-​cri​stin​a-​avalo-​la-​man​ipul​acio​n-​de-​las-​est​adis​tica​s-​del-​indec, pode-se ler que, de 2007 à me­tade de 2009, a mu­dança na me­to­do­logia de cál­culo do ín­dice de preços ao con­su­midor pos­si­bi­litou ao go­verno ar­gen­tino a eco­nomia de US$ 15,6 bi­lhões no pa­ga­mento de tí­tulos da dí­vida pú­blica. Não há outro mo­tivo para Clarín e La Na­ción, só­cios dos go­vernos que mais de­pri­miram o pa­drão de vida dos tra­ba­lha­dores ar­gen­tinos, exi­girem de Cris­tina Fer­nández o que nunca exi­giram de nin­guém: que a in­flação ofi­cial re­flita a alta dos preços no su­per­mer­cado – o que, de resto, não ocorre em parte al­guma (ou a in­flação me­dida pelo IBGE acaso é igual ao ICV do Di­eese?). Sur­real é que os jor­nais em questão te­nham con­se­guido fazer isso ao mesmo tempo em que apoi­avam uma su­ble­vação de for­ma­dores de preços de ali­mentos ocor­rida em 2008 contra a ten­ta­tiva go­ver­na­mental de li­mitar a margem de lucro das ex­por­ta­ções e evitar, assim, a alta dos preços in­ternos.

[14] Na Ar­gen­tina, o sa­lário mí­nimo geral não é apli­cável aos em­pre­gados ru­rais e às em­pre­gadas do­més­ticas. Essas ca­te­go­rias têm, em regra, pisos sa­la­riais mai­ores. Os va­lores atuais desses pisos foram de­fi­nidos em no­vembro de 2011, quando o sa­lário mí­nimo era $ 2,3 mil (R$ 1.095) e serão re­a­jus­tados em no­vembro deste ano. Para os tra­ba­lha­dores do campo, eles vão, hoje, de $ 2.763, ou R$ 1.316 (peões sem es­pe­ci­a­li­zação) a $ 3.236, ou R$ 1.541 (me­câ­nicos tra­to­ristas). Para as tra­ba­lha­doras do­més­ticas, va­riam entre $ 2.072, ou R$ 987 (tra­ba­lha­doras sem es­pe­ci­a­li­zação que não dormem no em­prego) a $ 2.839, ou R$ 1.352 (go­ver­nantas, damas de com­pa­nhia, en­fer­meiras, ins­ti­tu­trizes e mor­domos que moram no local de tra­balho), com ex­ceção da pro­víncia de Cór­doba, onde vi­goram pisos de $ 2.291 (R$ 1.091) para quem tra­balhe em turno in­te­gral sem dormir no em­prego a $ 2.526 (R$ 1.203) para tra­ba­lha­doras que de­sem­pe­nhem as ta­refas men­ci­o­nadas an­te­ri­or­mente. Essas in­for­ma­ções podem ser con­fe­ridas em http://​www.​trabajo.​gov.​ar/​dow​nloa​ds/​agrario/​res_​cnta_​071-​2011.​pdf , http://​www.​trabajo.​gov.​ar/​dow​nloa​ds/​dom​esti​co/​res_​1350-​2011.​pdf e http://​www.​trabajo.​gba.​gov.​ar/​Res​oluc​i%C3%B3n%20M​TESS%201​351-​11.​pdf.

[15] O re­a­juste deu-se em agosto de 2012, du­rante a ela­bo­ração deste ar­tigo; até então, o valor era 2,3 mil pesos, (R$ 1.095). Poucos dias de­pois, no Brasil, o go­verno re­meteu ao con­gresso pro­posta de Lei de Di­re­trizes Or­ça­men­tá­rias para 2013 pre­vendo o re­a­juste do sa­lário mí­nimo para R$ 670 ($ 1.407) a partir de ja­neiro; em fe­ve­reiro de 2013, porém, o menor sa­lário ar­gen­tino será re­a­jus­tado para $ 2.875 (R$ 1.369).

[16] Entre a con­cepção e o parto, o nome é asig­na­ción uni­versal por em­ba­razo para pro­tec­ción so­cial.

[17] O BPC é um dos bons frutos da Cons­ti­tuição de 1988. Sendo um di­reito exi­gível, sua con­cepção é oposta à do PBF e, das dé­cadas de 90 e 2000, tem apenas as dis­tor­ções que o im­pedem de ser me­lhor do que seu con­gê­nere ar­gen­tino. A maior delas é o con­di­ci­o­na­mento de sua con­cessão a um teto de renda fa­mi­liar per ca­pita igual ao quarto do sa­lário mí­nimo bra­si­leiro (622:4 = R$ 155, ou $ 326) –  menos de 1/8 do vi­gente no país vi­zinho. Em­bora se deva re­co­nhecer a Lula e, es­pe­ci­al­mente, Dilma algum es­forço de hu­ma­ni­zação dos pa­râ­me­tros de acesso a ele – que, pelo re­gu­la­mento de FHC (De­creto 1.744/95), era ne­gado a quem con­se­guisse andar, vestir-se ou hi­gi­e­nizar-se –, dez anos de go­verno não foram su­fi­ci­entes para que o PT se de­ci­disse a eli­minar esse teto.

[18] http://​www.​pet​icao​publ​ica.​com.​br/​Pet​icao​Ver.​aspx?​pi=P20​12N3​0206. Não que países como Es­panha e Grécia es­tejam muito longe de pre­cisar dela, mas a emer­gência so­cial que co­meça a existir lá é a con­dição na­tu­ra­li­zada da so­ci­e­dade bra­si­leira há 500 anos.

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